24 abril 2012









“Foi então que o povo armado/percebeu qual a razão/porque o povo despojado/lhe punha as armas na mão”. Anos são ora 38, poucos se calhar para marcar uma sociedade, um país, muitos serão de desespero permanente, no ansiar do cumprimento de velhas promessas. Antes, a 24, sabíamos o que não tínhamos, sofríamos na pele a repressão de um regime de força bruta e de ignorância completa. Hoje, após uma revolução, vemos a coisa a voltar para trás. Claro que nunca teremos o mesmo filme, as técnicas são outras, reprime-se de outra maneira, tão subtil é o regime da paz pobre de uma democracia que da formalidade não passa. A realidade está nas estatísticas que colocam Portugal na cauda da Europa, em termos de desigualdade. Força bruta sim, temo-la agora de volta, tal e qual como antes, a reprimir manifestações, uma polícia que já não é de choque, mas que choca só de vê-la actuar. Um País assustado e triste que parece nem reagir ao atropelo constante de que é vitima. Um País cada vez mais pobre, cada vez mais dominado, cada vez menos autónomo. Um País amordaçado, apesar da “liberdade de expressão”. Um país diariamente anestesiado por uma comunicação social vendida aos grande interesses dos grupos económicos. Um País condenado a viver na austeridade permanente, por um governo execrável, do pior que existe, composto por personagens menores, com ideais autoritários e profundamente avesso ao desenvolvimento e à justiça social. Um País de novo com medo, com as pessoas limitadas nos seus direitos e uma grande parte privadas do direito mais essencial, o direito ao trabalho. Um País amordaçado. Um País vendido a preço de saldo à ganância de alguns e com a bênção daqueles que governando, desgovernam de facto o País. Um País maltratado. Um País, entretanto perigosamente submisso.

Sabemos que urge mudar, não sabemos bem por onde começar, não é fácil, porque muito provavelmente é preciso mudar tudo. Procuramos a inspiração no Poeta, “Foi então que Abril abriu/as portas da claridade/e a nossa gente invadiu/a sua própria cidade”, sentindo que ás tantas só virando isto tudo do avesso…

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Excertos: "As Portas que Abril abrui", José Carlos Ary dos Santos

06 abril 2012


CONQUISTADOR

Da notícia épica feita para europeu ver, reza a crónica de uma cidade vendida por 900 mil dólares, a um vietnamita. Pelo que vejo, uma pequena cidade, a mais pequena cidade norte-americana, de seu nome Buford, vendida na passada 5ª feira, em leilão. Quem vende assim uma cidade, mesmo uma cidade pequena, sem estar a espera de um troco, mesmo que somente para compensar algum dinheiro investido, em infra-estruturas, edifícios, rotundas…? A circunstância tremendamente evidente de o Conquistador ser um vietnamita, mais curiosa faz a estória, ilustrando quiçá uma pequena, mas saborosa vingança. Quem sabe, para ser servida fria a qualquer americano mais patriota. O sabor da conquista é tanto mais enleante, quanto o sabor a vitória conquistada. Todos os que, como nós, navegamos para lugares desconhecidos, partem com um desejo secreto de um dia poder reclamar algo de seu na tal conquista. Mesmo que seja num leilão, onde o objecto exposto está sujeito a todos os olhares, cobiçado por mil desejos, sendo que a maior parte deles nunca se poderão realizar, por nítida falta de fundos. Seja então o Conquistador, aquele que logra a esperança de algo encontrar, mesmo disfarçado, And in your death-masked face / There are no signs which can be seen (1) . Que faça seu o triunfo, mesmo que efémero, de uma conquista de duvidoso sabor, que seja o seu, tudo bem, que não envolva mais que isso, mas ao qual devemos prestar a devida homenagem, como vem na canção. Num tempo em que há quem nada saiba, nem possa nunca conquistar, porque simplesmente não possui, nem a classe, nem o saber, nem muito menos a virtude, para poder a tal aspirar. Porque lhe faltará audácia, perspicácia e tudo o mais que o conquistador tem que ter, para de facto Conquistar…

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(1)   Extracto de “Conquistador”, Gary Brooker and Keith Reid, Procol Harum, 1967

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