20 fevereiro 2008



As sombras dos cavalos no mar…
(ao António Lobo Antunes)

Às vezes a leitura de um artigo[1] faz-nos acordar para realidades ou sonhos que não alcançamos. Ou porque somos os tais mortais sem aquela argúcia de captar coisas singelas ou porque andamos simplesmente distraídos pela vida, absorvidos por ninharias que se calhar até têm menos interesse. Se calhar. Com a devida vénia ao António [2] , penso que lhe posso “roubar” aquele frase enigmática, que não sendo dele, foi por ele apropriada: “que cavalos são aqueles que fazem sombra no mar?”. Não sei bem porquê, mas há coisas que cativam, que tocam, que despertam. No mar da tranquilidade que para mim é referência, não há limites para a imaginação. Posso daqui, não muito longe do mar, ver formas que não fazem sombra, mas dela se alimentam. O mar daqueles sonhos de tardes sem fim, á espera que algo aconteça, sabendo que na realidade não queremos que aconteça nada. Numa tarde na praia de Apúlia encontro uma menina que atira pedrinhas para longe á espera que o mar lhe devolva alguma trazida por um peixe vermelho; verdade, esperas mesmo (?), não sei mas ele é capaz de vir porque eu lhe pedi… Assim se preenche o tempo, mais importante para a menina que qualquer relatório de um qualquer conselho de administração que revela as tendências em alta da economia europeia. Às malvas a rotina, é mais importante compreender de facto o ponto de vista dos outros, por mais intricado que nos pareça. Entretanto, os cavalos na praia correm sem destino nenhum e a sombra que deixam não chega para nos ensombrar a vida, antes pelo contrário. Continuo daqui, no meu sofá emprestado, a ver as ondas e a imaginar o tal peixinho vermelho sorridente a entregar a pedrinha que a menina lhe pediu… a imagem é tão boa como outra qualquer, desde que gostes e que acredites.

“O homem que se sentia losango”
[3] não tem que dizer porquê, é sempre uma sensação obtusa, que gira qualquer ângulo, numa geometria mais variável que a própria sombra. Podemos estar com ele e não dar conta dos universos infinitos que percorreu sem sair da cadeira, mandando farpas para todo o lado, incluindo este. Acusamos o toque, porque não é grave, embora uma dor aguda possa eventualmente percorrer a alma, esteja ela onde estiver. As tais tardes no mar não são pois forjadas, estamos lá os dois sempre de mão dada, á espera dos cavalos que fazem sombra, não a nós, que curtimos o sol até nos entrar na pele e nos bronzear por dentro. A cor vale tudo, mesmo na sombra, o resto és tu…

[1] Artigo de A. Lobo Antunes, revista Visão de Janeiro 2008, vale a pena saborear: http://aeiou.visao.pt/Opiniao/antonioloboantunes/Pages/Quecavalossaoaquelesquefazemsombranomar.aspx

[2] António Lobo Antunes
[3] Ainda reporte de A. Lobo Antunes, também na Visão de 8 de Fevereiro

08 fevereiro 2008


O ANO DO RATO


Rato é o ano 2008. De rato e de louco todos nós temos um pouco. Será? Este Fevereiro inicia, segundo a tradição chinesa, o ano do Rato. O roedor andará assim mãos dadas ao que parece com a intranquilidade nos mercados financeiros e alguma preocupação com acidentes, á semelhança da 1996. E por cá? Eu, nativo de Rato e Sagitário por imposição natural prefiro vogar nas ondas do tempo, à espera do Sol, que já vai dando uns ares da sua graça, enquanto saboreio um Aznavour eterno, que passeia por Lisboa. Passado talvez, la bohème, “…nous récitions des vers, groupés autour du poêle, en oubliant l'hiver…”. Através dos dias cinzentos do norte, aguardamos talvez que o rato roa algumas cordas que ainda nos atam. Talvez alguma ratice nos safe, no meio da confusão dos dias. Rato, estou contigo, apesar de preferir o gato. Andaremos por aí na esperança de não cair no esgoto, como o rato, isto não está para brincadeira. “…La bohème, la bohème, et nous avions tous du génie”…

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