31 dezembro 2010

A Voz que é preciso em 2011!
“…Em Lisboa fica o Tejo a ver navios
dos rossios de guitarras à janela…

Foi por ela que eu passo coisas graves
e passei passando as passas dos Algarves
com tanto santo milagreiro todo o ano
foi por milagre que eu até nasci profano
…”

“Foi Por Ela”, Fausto Bordalo Dias













Se há um ano atrás esperávamos mudar o Mundo, ou simplesmente alguma coisa para melhor, encalhamos hoje num porto que de seguro nada tem, a não ser a amarra que nos liga teimosamente à luta. Já não há rossios de guitarras à janela, que foi por ela (a luta) que eu passei das minhas contas, canto que é de Amor, mas de Luta também, precisa mais que nunca, como resposta à ignóbil ameaça que enfrentamos. Pois que acabamos o ano como começamos, será uma sina, será que é fado, será que ainda é o bolorento e cinzento ar dos brandos costumes do fascismo, agora temperados pela voz de um senhor que manda e quer mandar mais, candidato que nos quer calar, porque diz, fala-se muito e muito alto, ora essa, mas a gente quer é gritar que não está de acordo! Não senhor, embora possa parecer, a gente quer é varrer isto tudo, a gente quer dizer aoTejo, “lava a cidade de mágoas / leva as mágoas para o mar / lava-a de crimes e espantos / de roubos, fomes, terrores, / lava a cidade de quantos / do ódio fingem amores / Afoga empenhos favores / vãs glórias, ocas palmas/ leva o poder dos senhores / que compram corpos e almas…” . Esperança é aquilo por que se luta, passar a palavra, porque amanhã pode ser tarde demais, hoje pois, é como se fosse já amanhã, nem tarde nem cedo, espero que estejas sempre comigo, que não percas nunca este rumo, simples acorde, qualquer que seja a letra, é a tua porque sabes o que queres, que mais se pode desejar para um ano que à porta está e tens que o deixar entrar. Frio no Norte, ou trinta e tal graus no Sul, desde que não se deixe esvair o tropical sentido na lapela, ontem mesmo hoje e sempre ainda agora
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Referências:
o “Foi Por Ela”, Fausto Bordalo Dias, “Para além das cordilheiras”, 1987
o “Tejo Que Levas As Águas”, Manuel da Fonseca e Adriano Correia de Oliveira, “Que nunca mais”,1975

12 dezembro 2010

Brava era a Avelã



“… E, contudo, cada indivíduo parece trazer à sua volta um halo de intangibilidade divina…”

Placa à entrada da aldeia, de Miguel Torga, in “Diário VII, 3ª edição revista, pág. 185/186”
















Brava era a Avelã. Em tempos porventura remotos, que difícil é sempre medir o Tempo, em tempos que outros valores se parecem levantar. Deles entretanto fala sempre a natureza agreste da Terra Fria, onde quentes são as gentes e os modos como nos recebem e acarinham. E há os cheiros e os sabores, misturados com os vinhos, as aguardentes que temperam os repastos a qualquer hora. Porque andamos sem relógio, sem tempo determinado, sem aquelas obrigações que tolhem o dia-a-dia e, por vezes, as consciências. Recordamos os tempos da Guerra Civil espanhola, onde tantos resistentes foram assassinados, a aldeia guarda as memórias de algumas e alguns que defendiam a liberdade sem fronteiras, quando estas eram implacáveis para quem ousasse atravessá-las. Lembramos tempos em que o contrabando era uma arte, de fuga às regras das ditaduras de cá e de lá. De trás dos montes surgiam de quando em vez, sinais de revolta às tiranias, dos ecos poderiam falar as velhas pedras, caso lhes fosse possível o devaneio. O Pinto que o diria, se cá ainda estivesse, as estórias que contaria, das fugas e das traições, das cumplicidades dos camaradas das mesmas lutas de outrora e que hoje nos conta o Zé, nosso anfitrião. Ele e a Carminda, amigos de longa data, que souberam transformar as casas antigas em atraentes lares de refúgio, que desafiam a paisagem da albufeira, acrescentando valor ao belíssimo enquadramento daquela com a serra. Não há nada que falte, está tudo lá, a terra faz o resto: o limonete e o hipericão do Gerês, para o chá, a couve para a sopa, o tronco para a lareira., que quente faz o frio lá fora. Lembro Miguel Torga que à entrada da aldeia, atesta na pedra. “Por mais que tente, não consigo reduzir estas vidas de planalto a uma escala de valores comuns…”

Avelã Brava, Negrões, uma força incomensurável da Natureza…

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