11 agosto 2013


GIGI

Nome de uma improvável cadela de estimação, dessas que passeiam atreladas a madames mais ou menos decadentes ou a cavalheiros de sandálias e camisa aos quadrados e que cagam em tudo quanto é sítio e a coisa fica por ali até ser pisada por qualquer incauto. Cadela à parte, Gigi é, ao que consta nas revistas ditas cor-de-rosa, ou cor-de-laranja (…), nome de refúgio algarvio da dita classe colunável, curiosamente e na maior parte dos casos, sem qualquer coluna vertebral que se preze. Praia privativa, vivendas e apartamentos de luxo, conquistados provavelmente com os tais “excedentes” de um qualquer BPN, ou das receitas de produtos tóxicos, agora muito em voga. O meu marido deu-me um swap e eu vá e comprar mais este que é virado ao golf e longe da populaça, essa espécie inimiga. Isolados nos seus lofts, são uma espécie de miniatura de uma “sociedade civil”, que se atrela, tal como a cadela, ao poder, já de si acotovelado em umas poucas dezenas de metros quadrados, ali para o Terreiro do Paço, sujando de forma nada indelével, uma das praças mais bonitas da Europa. Tal como estes, nem sequer se aproximam dos 99% que restam, que ainda assim é muita gente e há sempre a hipótese de acontecer uma maldade, pequena ou grande, das quais o insulto e as “grandoladas” são (ainda…) uma pequena amostra.
Clara Silva escrevia em 2009”… Poucos nomes aqui se lêem em português, até porque os turistas com as carteiras bem recheadas são os principais visitantes da quinta mais chique do país. Numa das rotundas há um shopping com lojas de biquínis e restaurantes onde os empregados seriam mais honestos se nos apontassem uma pistola e nos roubassem o dinheiro. Mas ninguém parece ter problemas com isso.
Que diferença em relação a outros sítios, onde os parques naturais, com o da Ria Formosa, são preservados e protegidos. Aqui, onde existe, por exemplo, uma ponte pedonal de madeira, com cerca de 300 metros de comprimento a maior do género na Europa. Porém, apenas uma ponte para nos transportar, salvo seja, a um universo de privilégio, onde impera o riquismo, novo e velho, no fundo sempre o mesmo, de saque á custa daqueles a quem se pede, dia a dia, mais e mais sacrifícios.
Gigi pode ser, nesta silly season, mais cruel que curiosa, mais vazia que estúpida, mais puta que a que a pariu, um bom exemplo da diferença, contra a diversidade. E podia aconselhar a prática de algumas “actividades”, tipo radical, como o tiro aos patos (bravos), a caça ao tesouro, a escalada “swap”, ou um peddy-paper reforma dourada, com paragens obrigatórias nas modestas residências de algumas figuras conhecidas…
Ao café (1), sem qualquer saudade chegarão a hora do lanche, “…as boas maneiras/com anéis e pulseiras, de sapatos de salto/são as bichas matreiras, que só dizem asneiras/são rapazes pescados no alto…” e, como diz o Poeta, “…o que resta/é pó de talco”…

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(1) Referência ao poema “Café-Rua da Saudade”, J.Carlos Ary dos Santos: http://letras.mus.br/rua-da-saudade/1744680/     

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