14 fevereiro 2021

 O DIA DOS NAMORADOS (confinado...)





13 fevereiro 2021

É O DIA DA RÁDIO!

 


Se puderes, ouve. 

Ouve a rádio que ciranda por aí, possivelmente num transístor perto de ti. Está provavelmente presa em qualquer esquina, mas passa por aí. Não tem imagem, mas pode albergar belas alegorias, ao contrário da concorrência, onde se vê, a toda a hora, o horror do espectáculo, a vilania da agressão que entra pelos olhos dentro. A rádio que um dia libertou o País, à custa de tantos subterfúgios, de tanto enredo, na imaginação fértil de tanta gente, que nos deliciava com a doce amargura dos tempos de cólera. A rádio que um dia nos dava a voz da liberdade e no outro passava o discurso hostil da mentira. 

 

A doce ilusão.

bic laranja, bic cristal, duas escritas à vossa escolha”, “o boca-doce é bom é, diz o avô e diz o bebé” e esta que afinal quase parecia dar cartas, mas que se perdeu na espuma dos dias cinzentos, onde ficou a soberania, “o que é Nacional é bom”. Os jingles, assim ditos, perdidos na noite?

Perdoem-me se insisto, há uma beleza imensa na rádio, um afrontar constante à lembrança remota que vive em nós. Perdoem-me se invoco a corrente, e diga, “A rádio vai em ondas como o mar[i], frase evidentemente roubada ao Fernando, um Amigo que rema invariavelmente contra uma maré de marasmo e nos convoca sempre ao desassossego. E se com ele vou nessa maré, que tem tanto de vaza, como de deliciosa correnteza, posso quedar-me, por exemplo, ao pé do mar da palha, ou “...daquela janela virada p´ró mar[ii], ou de qualquer doca seca que me acolha, em dias de servidão.

Vê se consegues ver-me de lá, com o rádio de pilha ou, na versão digital do celular com fones. Estou penosamente à espera de mim, ou sagitando no ar, “Há sempre alguém que semeia/Canções no vento que passa.”[iii]

 

Que a rádio pode passar.

Quem não passa é esta saudade daqueles tempos em que o ouvido se colava, para escutar o som do silêncio, ou o barulho das luzes, quando as havia. Andávamos “Em Órbita”, ou no “Limite”, com “Tempo Zip” ou “Pão com Manteiga[iv], no rádio clube ou nos associados de Lisboa, que a nacional emissora não atracava nas nossas vidas, a não ser para a propaganda. 

A rádio que nos ensinou já não mora aqui, mas pode morar em qualquer canto deste País, como ele, sempre presente, sempre adiado.  

Deixa que te cite Amigo meu, que falas de uma “longínqua casa dos prodígios”, ou da “plasticidade das palavras”. Como tu acredito “...que a rádio vê e dá a ver no escuro.”[v]



[i] Crónica do meu Amigo Fernando Alves, TSF, 30 Junho, 2020, às 08:50 horas

[ii] Excerto de “Aquela Janela Virada P'ro Mar”, Frederico de Brito/Tristão da Silva

[iii] Excerto de “Trova do Vento que Passa”, Manuel Alegre/Adriano Correia de Oliveira

[iv] Nomes de programas da rádio, dos anos 60 e 70

[v] Idem nota 1


This page is powered by Blogger. Isn't yours?