31 dezembro 2021

O TEU BALANÇO É MAIS DOCE QUE O MEU (?)


 

Por esta altura do ano fazemos balanços.
Balançamos ou Balanceamos?
Uma ou a mesma coisa, aqui apenas se reflecte sobre quanto é mais doce o balanço.
Como se mede a doçura de um balanço?
Pela leveza da palavra?
Pela assertividade da afirmação?
Pela loucura do gesto?
Será porventura na leveza do discurso que descansa o segredo do conceito. Falamos de forma suave (doce) quando queremos ser agradáveis, serenamente. Expressamo-nos de forma vigorosa quando nos queremos defender. Ou "atacar" uma qualquer ideia, que julgamos correcta.
Resta então o balanço, que sendo um exercício de movimento constante, quiçá perpétuo, pensa ser um Direito a que temos direito. 
E temos.
Daí que, no último dia do ano, neste particular, um belo dia de Sol, queremos que seja ... a caminho do mar. Seja ele o mar do nosso destino, ou simplesmente do nosso contentamento.
Assim mesmo, a caminho do mar!
(para não dizer que não falei de marés)


24 dezembro 2021

 ERA – (2)
(podia ser uma estória de Natal)


 

















Era assim também.

Nesta quadra sempre vem à memória como era dantes, nos tempos em que a idade não era um posto, mas um gosto. 

Muito embora, como antes, o Natal seja uma festa cristã, uma data em que a igreja católica celebra o nascimento do Homem, as festividades habituais ultrapassam a religiosidade e deixam ao presépio a excelência da data. 

O presépio era o centro de tudo.

Quer pela imagem, quer pelo pormenor da sua construção, era o presépio o rei da festa da minha juventude. Que bem recordo o cerimonial da apanha do musgo e da escolha da árvore, calcorreávamos as matas mais próximas, eram quilómetros, era tanto tempo, na altura em que havia tempo para tudo. Eram 2 ou 3 cestos grandes com o musgo, apanhado nas encostas, em cima das pedras, enfim, nos lugares onde a humidade mais se fazia sentir. Ninguém discutia, na altura, o papel fundamental que os musgos representam para a preservação dos solos e para o combate à erosão, a apanha de musgo era uma actividade normal à época, não havia comercialização, como agora. 

A feitura do presépio era uma empresa considerável. Demorava dias a fio, era sempre numa das semanas de férias da Escola. Havia uma mesa enorme, nas lojas da Casa, que era transportada para a sala de jantar e ocupava seguramente uma parte considerável da área daquela. A primeira fase, o projecto, era a definição dos locais, saber onde iam ficar a cabana, a igreja, o rio, a ponte, e os vários caminhos a traçar no terreno. Depois, havia que atapetar a mesa com o musgo que se havia conseguido. Havia ainda elevações de terreno, feitas com caixas e pedaços de madeira, onde eram colocadas as casas, construídas pelo meu Pai, tal como a cabana do menino.  Os caminhos eram feitos com serrim que se ia buscar à fábrica do senhor Araújo. Depois vinha a colocação das dezenas de figuras, os pastores, os agricultores, os reis magos, os animais e, naturalmente, as figuras da mãe, do pai e do menino. A fase mais espectacular era, sem dúvida, a electrificação do presépio: a cabana, a igreja e todas as casas tinham dentro uma lâmpada e respectivas ligações, fios e cabos, constituido daquela forma a iluminação, a face mais apelativa da obra.

Ditava a tradição que o presépio só ficaria concluído no dia 24 à noite. O caminho dos reis magos iniciava numa ponta da mesa e terminava do outro lado, na cabana. Todos os dias as figuras iam avançando no terreno, até lá chegarem na noite de 24, uma tarefa que era cumprida sempre com afinco.

 

Hoje, sem musgo e sem árvore, improvisa-se da melhor forma possível. Mas as figuras, ou algumas delas, ainda fazem parte do meu património de outros tempos e ocupam orgulhosamente o seu lugar na construção actual. Já não existem as velhas lâmpadas incandescentes de outrora, as casas passaram à história, reflectindo um pouco a crise da habitação que deixa muita gente na rua, os reis em vez do ouro, incenso e mirra possivelmente levam acções de qualquer banco falido e que ninguém quer e somos nós que levamos a oferenda, ou seja, todos os anos, e várias vezes ao ano, lhes “emprestamos” o capital de que eles “precisam”, a caricatura de uma modernidade que distorce a realidade e vive da ilusão. 

 

Fica a imagem e, porque não, que viva o presépio!


This page is powered by Blogger. Isn't yours?