10 maio 2009

CRÓNICAS CABO-VERDE 1: a Intervenção


Sempre chegamos aos sítios aonde nos esperam
Do “Livro dos Itinerários”, citado por J. Saramago, in ”A Viagem do Elefante


De novo o calor de África, o estranho fascínio pelo Sul, pelos espaços de liberdade, ao menos espiritual. Cabo-Verde, das mornas e coladeras, que ontem saboreei no “Quintal da Música”, da calma da praia da Praia, da confusão completa do Sucupira (1) trazendo à memória o antigo Kinaxixi (2) da brisa dos fins de tarde. As habituais trapalhadas dos primeiros dias, misturadas com o apagão da Internet, mas sempre os Amigos que nos acolhem e nos fazem sentir em casa.
Desta vez para participar num Seminário de Formação Sindical, uma iniciativa da CPLP-SE (3) . E aqui de novo para falar sobre “Educação e Cooperação para o Desenvolvimento Sustentável”, para professores, sindicalistas do sector da educação e outros agentes de educação formal. Porque se tratava de um público especializado em questões de Educação, procurei ajudar a reflectir sobre as enormes responsabilidades do sector no que reporta aos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio (ODM), um incentivo à promoção de acções concretas, junto de colegas, alunos, formandos, famílias e comunidades locais. A adesão foi deveras significativa, até pela “novidade” do tema, já que só uma pequena percentagem dos participantes tinha ouvido falar nos ODM. E, para além disso, a perspectiva da maioria das pessoas, sobre as questões da Cooperação Internacional para o Desenvolvimento era meramente assistencialista. Muito importante foi de facto, abordar o verdadeiro sentido (e significado) do conceito APD (4), em que consiste, como funciona, os programas e incitativas comunitárias (União Europeia) para os países em desenvolvimento, muito embora este País esteja colocado numa espécie de “limbo”, nas classificações internacionais. Também algumas questões operativas e ter em conta, neste contexto.

Um pormenor muito significativo que me foi dado observar tem a ver com o gosto e orgulho em ser Professor. Embora eu não seja (apesar de o ter sido em tempos) sei o que se vai passando no meu País, onde considero que a função (missão?) de professor está completamente desprestigiada; penso aliás, que chega a ser alarmante a situação no Ensino em Portugal, nas escolas, onde o Professor deveria ser respeitado, dada a responsabilidade que tem na formação das crianças e dos jovens, para uma sociedade mais justa, mais equilibrada, onde a problemática do Desenvolvimento Sustentável é uma questão transversal de enorme significado, para uma Cidadania Global responsável.

Assim, estes encontros muito nos ensinam. O discurso poderia eventualmente perder-se (tantas vezes acontece…) nas apertadas fronteiras da formação tradicional. Desta vez porém, o sentimento é outro: acreditamos todos, organizadores, formandos e formadores, ser possível uma transformação, se bem que por vezes difícil de definir e mesmo de concretizar: de atitudes, de vontades, de metodologias e estratégias visando resultados, a curto, médio ou longo prazo. Acreditamos que vale a pena, que pode realmente fazer a diferença, uma postura de confiança, num Mundo melhor, mais justo. E são as gerações mais novas que devem ser alertadas para as questões globais, como a luta contra pobreza e a marginalização de 2 terços do Planeta, da erradicação do analfabetismo, entre tantas outras, numa perspectiva de mudança; para tal, devem saber o que se passa no Mundo, conhecer o passado, analisar o presente e aprender a perspectivar o futuro. É uma Missão do Professor e, os responsáveis políticos devem entender, de uma vez por todas, que nenhuma “reforma” se faz contra os professores, mas sim com os professores.

No Seminário da Praia sentimos solidariedade, muita confiança, muito respeito e alegria de viver; de passar a palavra e espalhar a notícia, pelo menos nas 10 ilhas deste Arquipélago. Daqui partiremos para os outros países de língua portuguesa. Com algum sacrifício, diga-se de passagem, uma vez que representa um grande investimento, para o qual (para já) os organizadores não têm a sustentabilidade financeira que gostariam. Que sirva esta crónica pelo menos para chamar a atenção daqueles que têm a responsabilidade da repartição de verbas, em Portugal, mas não só, já que parece haver situações de desperdício noutros países da CPLP. Para todos, a mensagem é muito simples: provar na prática e no terreno a vontade expressa em apostar na Educação para o Desenvolvimento Sustentável.

Atenção CPLP, estaremos atentos!
Praia, 2 de Maio 2009
Alf.


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(1) Mercado tradicional da Praia
(2) Antigo Mercado de Luanda, demolido para construir um grande Centro Comercial
(3) CPLP-SE: Comunidade das Organizações Sindicais de Professores e Trabalhadores em Educação dos Países de Língua Portuguesa, Sindical da Educação.
(4) Ajuda Pública ao Desenvolvimento


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