10 junho 2010

Com papas e bolos se enganam os tolos…
Parte III – as Vacas Sagradas




Ainda que os juízes mais sagazes,
e as próprias feiticeiras,
estivessem convencidas do carácter culpável
das práticas de feitiçaria,
contudo a culpabilidade das feiticeiras não existia.
Assim acontece com toda a culpabilidade


Friedrich Nietzsche



Na Índia, a população é maioritariamente Hindu. Esta religião venera a vaca como sendo um animal sagrado. Na Índia, as vacas passeiam tranquilamente pelas cidades e vilas sem que sejam minimamente molestadas pelos habitantes, incluindo quando as manadas invadem as praças, onde comem os legumes dos produtores, sem que estes mostrem qualquer hostilidade para com o gado bovino. Devido a estas situações, algumas vacas desenvolveram um gosto especial por frutas. Algumas pessoas, de todas as castas, incluindo as mais altas, deixaram para trás as suas profissões para se dedicarem exclusivamente ao bem-estar das vacas mais fragilizadas e/ou mais velhas, criando vacarias que são sustentadas por eles próprios e por outras pessoas que lhes vão dando donativos. Entre estas pessoas, podemos encontrar políticos, médicos e toda uma série de profissões que neste país são muito importantes.” (1)

No resto do Mundo e também na Índia (porque não?) existe um universo paralelo, onde a população é maioritariamente pobre e pratica uma espécie esquisita de religião que venera um esquisito espécime, que dá pelo nome de Banca. Isso mesmo, tal como na história (verdadeira), os donos da Banca passeiam tranquilamente pelas cidades e vilas sem que sejam minimamente molestados pelos habitantes, incluindo quando as manadas invadem as praças, onde comem os produtos dos produtores, sem que estes mostrem aparentemente qualquer hostilidade para com eles. E ainda, tal como na história (verdadeira), alguns governos, de quase todas as matizes, incluindo as mais altas, deixaram para trás as suas profissões para se dedicarem exclusivamente ao bem-estar das vacas mais fragilizadas e/ou mais velhas, leia-se os bancos falidos, criando sofisticadas agências próprias, que são sustentadas por eles próprios e por outras pessoas que lhes vão dando donativos.

Como se pode ver, nada mais que a realidade pura e dura dos dias que vamos vivendo, perante a complacência daquelas e daqueles que nos tentam “vender” a ideia da inevitabilidade da coisa. E é vê-los aqui e mais além, a inventarem medidas para “reduzir o défice”, para “salvar a nação”, para “unir esforços contra a crise” e outras balelas do género, enquanto sugam os recursos dos que menos têm, mas que, à força de tanto ouvirem, lerem e verem a propaganda dos regimes, acabam por acreditar que de facto, não há outra solução: alimentar as vacas sagradas, tornando-as cada vez mais gordas e anafadas. E para arredondar, encontramos na realidade real, políticos, médicos e toda uma série de profissões que neste universo surreal, são muito importantes...

No País em que tentamos sobreviver, a Banca lucra neste momento, 5 milhões de euro por dia! A taxação de IRC à Banca em Portugal é de 15,6%, enquanto as restantes empresas pagam efectivamente 25%. Estudos recentemente efectuados levam a concluir que se a Banca pagasse o mesmo que as empresas, as receitas seriam mais do dobro do que o país precisa para o reajustamento orçamental. Um singelo exemplo: “Trading faz subir resultados do BES para os 119 milhões de euro, o que corresponde a um aumento de 17,6% nos lucros(2).

No mesmo País, que dizem à beira mar plantado, esbanjam-se actualmente 7.856 milhões de euro com o offshore da Madeira. Segundo dados do Diário da República nº 28 - 1ª Série, de 10 de Fevereiro 2010 (Folha 372) (3), a despesa orçamentada para a Assembleia da Republica é, em 2010, de 191.405.356,61 (191 milhões, 405 mil, 356 euro e 61 cêntimos), incluindo rubricas diversas: vencimentos, transportes, deslocações e estadas de deputados, assistência técnica (??), outros trabalhos especializados (??),restaurante, refeitório e cafetaria, equipamento de informática, outros investimentos (??), edifícios, transfer's (??) e diversos (??), subvenções aos grupos parlamentares e a campanhas eleitorais. Os PEC 1 e 2, representam na sua essência a protecção das “vacas sagradas” e a subserviência do Governo de Portugal (e outros mais Governos) às mesmas “vacas” de sempre. Eles (Governos) são cúmplices conscientes da Grande Vaca Angela Merkl, mentora-mor da política económica, a nível do espaço europeu.

Num arrojado discurso no Parlamento Europeu, a propósito da situação na Grécia, Daniel Cohn-Bendit disse de forma clara, simples e transparente. "Vocês estão completamente loucos", ou "...como é possível um País com 11 milhões de habitantes ter um exercito de 100 mil soldados, enquanto a Alemanha tem 200 mil?", ou ainda "... estamos a ajudar a Grécia a comprar as nossas próprias armas".. É esta a solidariedade europeia, é este (pelos vistos) o Programa Social Europeu de que tanto se gabam os responsáveis pela União e uma subserviente Comissão Europeia, perante a prática política do directório franco-alemão.

Numa célebre tese, escrita entre Dezembro de 1851 e Março de 1852, conhecida como “O 18 Brumário de Luís Bonaparte”, Karl Marx escreveu: “Hegel observa em uma de suas obras que todos os factos e personagens de grande importância na história do mundo ocorrem, por assim dizer, duas vezes. E esqueceu-se de acrescentar: a primeira vez como tragédia, a segunda como farsa”. Palavras para quê?

Tragédia e farsa misturadas a rigor neste século XXI, na deriva neoliberal, com os resultados que se conhecem: aqueles que nada fizerem para crise das “vacas sagradas”, a pagar às ditas sempre mais e mais. Quem se lembra ainda da “coesão social”, dos compromissos assumidos pelas Nações Unidas no ano 2000, do “modelo social europeu” , do próprio “Tratado de Lisboa”?

Vacas sérias e honestas de todo Mundo, Uni-vos!

(Fim)

(1) In: http://bicharada.net/animais/topicos.php?bid=33
(2) In: “Diário Económico, 12 Maio 2010, pág. 28
(3) In: http://www.dre.pt

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