11 junho 2015
Contributos Para O Desassossego (2)
A TRISTE APARÊNCIA DA DESGRAÇA
“A única
coisa que importa é o triunfo do agora.
É a isto que
eu chamo a «cegueira da razão»”.
“Outros Cadernos, El Cronista”, José Saramago,
1998
A
pobreza confrangedora do discurso combina na perfeição com o personagem triste
e vergado ao peso da péssima imagem que tem no País. Sem a mínima possibilidade
de elaborar umas palavras que façam a diferença, sempre colado e conivente com
a desastrosa política do governo, o homem lá vai repetindo um discurso
cansativo, de recorte sistematicamente semelhante, não poupando os que ainda
são capazes de o ouvir durante mais de 2 minutos. Para quem fala ele afinal?
Para fora, para dentro, para os privilegiados (como ele) dos negócios do BPP,
para meia dúzia de reformados de luxo (como ele), para os detentores de
refúgios no Algarve, para os banqueiros, para os homens de recorte duvidoso que
sempre o acompanharam, para uma minoria social que cada vez mais cresce em
dividendos e prebendas? Entretanto que palavras tem para os que sofrem na pele os
desmandos da sua clique, para os desempregados que penam dia a dia sem qualquer
esperança de encontrar trabalho digno, para os jovens que são o futuro do País
e que não vislumbram futuro nenhum, para os seniores que vêem cortadas as sua
pensões e têm que sustentar filhos e netos, para uma enorme massa humana que
vive no limiar da pobreza? Nada, um completo vazio, tal como a sua personagem
entediante. Arautos da desgraça? Que dizer disto, quando o futuro parece ser
penalizar sempre e cada vez mais as gerações que vivem do trabalho, cada vez
mais precário e indigno? Desgraça é ter um personagem destes num lugar que
deveria ser de respeito. Desgraça é ouvir a lengalenga do costume, sempre
pautada pelo elogio da injustiça social e da conformidade perante o ataque aos
direitos das pessoas. Alguém disse, suprema ironia, que se iria condecorar a si
próprio, pois ninguém no futuro será capaz de o fazer. Tendo falhado em toda a
linha, vem agora “despedir-se” com mais do mesmo e sem o mínimo sinal de
generosidade. Nem para os que nele alguma vez terão confiado o voto. Superior a
tudo isso, pairando numa nuvem seca que não é capaz de dar um único pingo, o
homem não é capaz de acabar o mandato com dignidade, porque é muito capaz de
não conhecer o termo, ou dele ter a imagem distorcida que caracteriza o seu semblante
tenso e carregado, capaz apenas de produzir um sentimento: tédio.
Sem ser
capaz de dizer em português correcto “cidadãos”, preferindo os “cidadões” que
qualquer corrector emenda de imediato. O homem que sempre teve razão triunfa no
agora, porque o agora é efémero. Como é porventura limitado na capacidade de
análise, contenta-se apenas com isso.