09 agosto 2015

MOURÃO – ALENTEJO (1)























Nobre e mui digna vila, com cerca de 1800 habitantes, Mourão tem a particularidade de, em tempos idos, ter existido fora do sítio geográfico em que hoje se situa. Razões históricas, ligadas a guerras e disputas com os vizinhos espanhóis, ocasionariam a dita desconstrução territorial. Os ocres e os azuis, por vezes também os verdes e o rosa, fazem as cores desta terra que tem, nas águas do Alqueva o complemento natural de uma paisagem rica de matizes, de percursos, de gentes que sabem receber, acolher e demoradamente conversar pela noite dentro, com aquele copo que deleita o corpo e liberta o espírito. As estórias de um Alentejo esquecido, mas sempre renovado. Haveríamos pois de conhecer a lenda da oliveira que, plantada no centro da vila, fornecia a quantidade de azeite suficiente para iluminar a Senhora das Candeias e que seria um dia, alvo da fúria dos elementos, ao ser atingida por um raio que a partiria em 5, visível ainda hoje.

Aqui o tempo é seguramente diverso de outros locais, se é que estes conseguem força suficiente para determinar a sua definição. Lembro a reflexão de Thomas Man[1], “É o tempo uma função do espaço? Ou vice-versa? Ou são ambos idênticos? O tempo é activo, traz consigo. Que é que traz consigo? A transformação[2], sábias interrogações, bem ao sabor do inquieto autor. E transporto o tempo para Dª Catarina de Bragança[3] que um dia, arrebatada pela devoção exacerbada à Santa, haveria de a “deslocar” para Londres, mesmo a contragosto das gentes da terra.

A visita a Adega Velha inclui, entre o espanto e o júbilo de conhecer coisas novas e diferentes, uma espantosa colecção de rádios e gravadores antigos, dos tempos da electrónica a válvulas, que ostentam uma parede inteira de uma das belas salas de repasto daquele que é seguramente um dos ícones da Vila.

Aprendemos sempre, com gentes, culturas e terras, por toda parte. Hoje sabemos desencapersionar, que é o mesmo que desafiar. Aceitemos então o desafio e vamos por estas terras do Alentejo a procura do sossego e do recato que a grande cidade tantas vezes nos retira.



[1] Escritor e ensaísta alemão, (1875-1955), Nobel de Literatura em  1929
[2] Citado de “A Montanha Mágica”, (1924) pag. 256
[3] Filha de D. João IV de Portugal, da Casa de Bragança, e da rainha D. Luísa de Gusmão (1638-1705)).


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