01 janeiro 2016

2016

Não habitamos um país, habitamos uma Língua. Uma pátria é isso
Emil Cioran, 1965


Procuramos sempre captar nos escritos, os sinais e os símbolos da nossa permanente inquietude e insatisfação, nesta voragem dos dias, que loucos parecem à vista do observador menos atento. Há outros (diversos) rascunhos que, por uma ou outra razão, não vêm a luz do dia, e como tal estão enterrados num qualquer baú, nunca se sabendo se serão recuperados, reciclados ou simplesmente enviados para a caixinha divinal da reciclagem. Ou seja, lixo.

Poderia lembrar que o último ano de chumbo chamado 2015, acabou por ser, na sua recta final, pejado de surpresas, algumas das quais com aquela sensação de agrado, que não conhecíamos há muito, muito tempo. Não escondemos pois a alegria e a esperança de ver o País respirar de novo, após 4 anos completos de imobilismo, da mais vil campanha de descredibilização do País, da responsabilidade de uma seita, que desrespeitou as mais elementares regras da democracia, vilipendiou e empobreceu as pessoas, degradou as instituições e as suas organizações de base, vendeu o País ao desbarato, sempre com a suprema infâmia de transferir para o capital os rendimentos do trabalho, já de si mal-amado e mal pago. Foi tudo mau de mais para ser verdade, mas o facto é que o tal grupo foi avançando, de asneira em asneira maior, da tentativa ao real, da campanha ideológica mais refinada à mais diabólica atitude de conservadorismo podre e balofo que nos fez recuar muitas vezes ao tempo já longo do fascismo mais requentado. Não é possível enumerar todo o mal que fizeram ao País, vão-se agora sabendo alguns pormenores que, juntos aos sinais que se adivinhavam, ajudam a construir uma narrativa de miséria e de terror. Não poderemos esquecer aquela “gente medíocre que se tornou salvífica pelo serviço que prestaram a interesses particulares presentes na economia”, assim classificada pelo Pacheco Pereira. Não poderemos esquecer o que fizeram, por exemplo, nos Estaleiros de Viana do Castelo e na TAP, apenas dois exemplos de como foi possível desbaratar os dinheiros públicos e reduzir a cinzas uma e outra empresa, para poderem utilizar o argumento da putativa falência que teria que ter unicamente uma solução a vista: a sempre inevitável privatização.

Neste ano que ora começa é em primeiro lugar mais que necessário destruir o mito dos apelados “superiores interesses nacionais”. O nosso País tem, como todos os outros, interesses perfeitamente contraditórios, que não são de forma alguma conciliáveis. Repare-se como a clique que normalmente ocupa o poder se refere às classes trabalhadoras: greves que põem em causa a economia, contabilizam-se inclusivamente os “prejuízos” por cada dia de greve (…), sindicatos controlados pelos comunistas, aumento de salários, como assim (?), onde se vai buscar o dinheiro, fraca produtividade, pouco tempo útil de trabalho, entre tantas outras declarações que se repetem até a exaustão, marteladas devidamente na comunicação social que superiormente controlam, a bem da nação (…). O reverso da medalha não tem contudo expressão idêntica. Falamos dos milhares de milhões desbaratados pela banca e alta finança, um sucessivo multiplicar de situações danosas, quer a nível das aplicações financeiras de alto risco, sempre em prejuízo do Estado, que na escandalosa situação de falência dos bancos, acompanhada sempre pela classificação de “resolução”, escondendo a verdadeira situação de descontrolo sistemático de contas, sempre na expectativa de que o Estado venha “salvar” a situação, com a injecção de mais uns milhões, que sempre aparecem milagrosamente, na hora certa e no momento oportuno.

Este será o mais grave dos sintomas de uma doença que parece alastrar, acompanhada do remédio mais impuro de que há memória: a pretensa inevitabilidade, a Europa tem as suas regras, em todos os países é a mesma coisa, olhem a Grécia e no que deu a rebeldia de um governo irresponsável e muitas outras atoardas, que infelizmente pegam, é ver algumas pessoas comuns com o mesmo discurso, vergadas ao peso de uma evidência que para elas já é adquirida e que não se julgam capazes de desmontar.

A Direita é o que é. O mais requentado argumento do imobilismo e conformismo foi dado por Paulo Portas aos jotas da autoproclamada Juventude Popular: "Deixem a utopia aos revolucionários e ocupem-se da realidade, de melhorar a vida da vossa geração e servir melhor o vosso país como se faz em qualquer país da Europa ocidental…". Formatar assim cidadãos, aqueles que um dia serão ministros ou secretários de estado, é a sua missão. Analisem cada uma e cada um dos que ocuparam aqueles cargos no defunto governo, estiveram durante 4 anos a frente do País, na mais clara expressão do que é a mediocridade e a inconsciência social.

Desafios enormes no ano que começa. A nível interno e também externo. Uma nova atitude, um novo discurso, a esperança sempre presente. Saber estar no País e no Mundo de forma diferente, uma posição de crítica sistemática, de defesa de direitos e de afirmação de deveres, na perspetiva da Cidadania. Na defesa das pessoas e do ambiente. Na exigência de uma Educação de alta qualidade, na defesa e afirmação da Escola Pública e de um Ensino Superior em que a investigação científica seja devidamente respeitada e apoiada. Na responsabilização das instituições, no funcionamento equilibrado do Estado e no compromisso que este tem para com os cidadãos que pagam os seus impostos e que esperam que aquele cumpra a sua missão. No questionar permanente da posição que o nosso País detém, na Europa, na Lusofonia e no Mundo, uma língua falada por 244 milhões de pessoas, uma riqueza incomparável e sempre mal aproveitada. Acima de tudo, o País tem uma dívida imensa sobre os jovens, meio milhão escorraçado pelo governo mais vil da República, desrespeito pela sua condição de futuro do País. E finalmente, a dívida incomensurável sobre os idosos, a quem o mesmo governo retirou direitos e colocou na margem da sociedade.

É da responsabilidade de todos nós defender a solução governativa que foi possível encontrar no consenso das Esquerdas. Nada que nos deva deslumbrar demasiado. Tudo que nos deve manter atentos e exigentes, tendo enfim consciência que não é possível mudar tudo de uma vez. Mas sabendo também que não é com episódios como o da “resolução” da questão Banif que se vai configurando um futuro diferente. Oferecer mais um banco português, pago com o nosso dinheiro, a um banco estrangeiro, que o recebe de graça e ainda com um bónus é de facto um sinal negativo, que mais uma vez fica mal ao Estado e ao Governo.

Trazer as pessoas de volta a nobre arte da Política será porventura o maior desafio para 2016. Mobilizar o País para votar nas presidenciais, faltam apenas 3 semanas. Saber que cavaco vai embora não é suficiente, é preciso muito mais, a saber, colocar na Presidência, uma figura de prestígio nacional e não um comentador de revista.


Somos pois pela utopia, que supõe conceitos e ideais de uma sociedade em evolução, sempre para melhor, sempre pela transformação permanente. Algo (e muito) nos separa daqueles que pensam que a “realidade” nos impõe a inevitabilidade. A luta continua portanto em 2016!

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