09 novembro 2018

OS NOMES DA BESTA


80 anos[1]
A memória de um dia, em que a intolerância gritou bem alto o seu argumento e despertou a besta fascista, contra um povo, contra a Humanidade. Nada nem ninguém conseguirá jamais justificar a desconfiança levada aos limites do ódio e da ignorância. Porque aquilo aconteceu na Europa, tão perto e tão longe afinal da compreensão humana.
Porque teriam eles desígnio tão vergonhoso? Mata primeiro e pergunta depois, mata simplesmente, acaba.
Ainda não era dia e já mais de mil sinagogas seriam queimadas em Berlim ou simplesmente destruídas. Mas a besta não ficaria por aí, teria que matar mesmo e destruir centenas de lojas, porque os seus donos eram judeus. Porque eram diferentes. Mas como a besta nunca está satisfeita e vive do sangue dos outros, vai sugando consciências, aligeirando processos até chegar ao extermínio.
Nada nem ninguém será punido por defender a sua causa, pensamos nós, tentando justificar-nos sobre a complacência e o silêncio. Por vezes somos o réptil que está tentando romper a casca do ovo[2] , embora a nossa consciência esteja por vezes noutro lugar, onde acreditamos ser mais fácil viver.
A besta não dorme e quase por ironia acordamos dentro dela, não é fascínio nenhum, são apenas os nossos medos. A nossa não-declarada impotência, para compreender o óbvio, casa bem com a aprendizagem a que constantemente fechamos as portas.
Não queremos, temos até algum pudor em chamá-la pelo seu nome, mas não adianta, ela avança sempre que pode. E há tanta gente a abrir-lhe a porta. Tanta gente que sem querer lhe proporciona o necessário conforto, e a besta vai ficando por cá, minando os alicerces que pensávamos sólidos, mas que para a besta, são apenas paredes de cartão.
Querem como antes fazer-nos acreditar que é preciso uma mente brilhante que aglutine o povo inteiro e fale em nome dele. É sempre o mesmo processo. Antes, queimavam lojas e matavam pessoas ao desbarato. Hoje, será tudo provavelmente mais limpo, queimam os neurónios com a arma mortífera da falsa notícia e matam lentamente com a economia de casino e com a mais inqualificável política da exclusão e da desigualdade.
Antes e hoje, convergem num ponto, a propaganda: mentirosa e pérfida, iníqua e rasteira, parcial e corrosiva. Capaz de traçar caminhos enviesados, pronta a excluir “suavemente” quem se queira atravessar no caminho.
Em todo o lado, a besta monta o seu arraial. E tem seguidores, admiradores até. Saber quem eles são e como sentem, torna-se imperioso. Fintam as suas próprias rédeas e desenham os seus próprios cenários.
Cheiram a bafio bolorento, não te parece? 
Têm agora tantos nomes, a besta transmuta-se em nomes diferentes para nos confundir, cada um com a sua cara, ou cabeleira, de capitão do exército a multimilionário, na Europa ou nas Américas, aqui bem perto, ou tão longe, tanto faz, é a mesma besta fascista, sim, não há que enganar.
Se bem que há quem queira vesti-la de pele de cordeiro, ou porventura pensar que se pode amansá-la, a besta é a besta simplesmente. Não de deve transigir, nem dialogar com ela. Nem pode, aliás, porque a linguagem que ela fala, não é a nossa. 
Apenas temos que lhe quebrar a espinha. 
Cortar-lhe a cabeça.  
Apenas e só!

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Atenção: Provavelmente hoje, ou amanhã, a qualquer hora, os lobos[3]  estão a entrar na tua Cidade...
https://www.youtube.com/watch?v=hVkWgksDZDI
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[1] No dia 9 de Novembro de 1938, ocorreram actos de violência em diversos locais da Alemanha e da Áustria, então sob o domínio nazi. Foi a chamada Noite de Cristal, a propósito da quantidade enorme de vidros quebrados. As acções foram designadas de pogroms (ataque violento maciço a pessoas, com a destruição simultânea do seu ambiente (casas, negócios, centros religiosos, cf. Wikipedia), com a destruição de sinagogas, lojas, habitações e agressões e assassinatos contra as pessoas identificadas como judias.
[2] Referência à obra “O ovo da serpente”, um filme de 1977, produzido por Dino De Laurentis e dirigido por Ingmar Bergman, que evoca a ascensão do fascismo na Alemanha; a história passa na década de 20 do século passado.
[3] A lembrar as palavras e a música do Serge Reggiani “Les Loups Sont Entrés Dans Paris”, (1967). A canção é comumente aceite como uma alegoria do avanço do exército alemão para Paris, e uma ode à Resistência.


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