25 novembro 2020

 25 EM NOVEMBRO DE 1975

 

As lembranças tornam-se perigosas 

quando deixamos de as falsificar

Adriano Santiago

In “O Mapeador de Ausências”, (2020), Mia Couto, Ed. Caminho pág.73

 

 

Fica dito aqui que o Adriano é o pai do Diogo, sendo que este é professor universitário e escritor. Os 2 Santiagos vivem na memória do Autor, que nos transporta à Cidade da Beira colonial, com as suas vivências são o seu Universo, quiçá na necessidade de voltar atrás, a uma infância vivida.

Vem isto a propósito das tais lembranças que, segundo o Adriano, se podem tornar perigosas, quem sabe à custa de um peso que carregamos, assim a modos que ligeiro, mas cuja “matéria” acaba por nos importunar.

São 45 anos, é muito tempo, vai tão longe a memória, que parece que foi ontem, está tudo aqui. Sei que para alguns, este vinte e cinco diz mais que o outro de Abril, pensam e sustentam que o de Novembro veio resgatar o que chamam de “espírito da liberdade e da democracia”, até o querem festejar.

Não é esse seguramente o meu ponto de vista. Estive lá, lutei, sofri e fui penalizado por isso, com a expulsão da tropa, a qual não haveria de causar danos de maior, a nível profissional, mas deixaria outros, cuja medida não sei bem definir, não o sabia na altura, hoje muito menos. Alguém falou, e dessa malfeitoria surgiria o “castigo”, nada a acrescentar, que a estória é conhecida de um círculo restrito, que nunca seria alargado.

 

As “evidências” viriam depois. 

Ao silenciamento das vozes da revolução, bem gostariam os autores do golpe de juntar outros, poderia ter acontecido, não fora algum recato de oficiais conhecidos. Mas bem sabemos, como disse na altura o Chico, que a Festa seria “murchada”[i], embora a semente esquecida num canto de jardim, fosse determinante, pelo menos, para a resistência.

Muita coisa mudou, o sistema acabou por se regenerar, os privilegiados voltaram, sabemos bem para quê, vieram os “mandadores da alta finança” que “Fazem tudo andar pra trás”, na sábia sentença do Zeca[ii], recompôs-se o “aparelho reprodutor” do capitalismo, vieram de todo o lado os “amigos”, jurando fidelidade à nova situação, erradicados que haviam sido os “males da Revolução”. Uns anos mais tarde, mais concretamente em 1979, o Zé Mário Branco haveria de transportar para o monólogo “FMI”, a mais “bela” e aterradora imagem do Portugal saído do 25 de Novembro.

Nem vale a pena dizer mais, ora que passados tantos anos e até parece que a semente do Chico, ou se plantou em solo desconhecido, ou murchou de vez, para sempre...

Nada mais errado.

É que a semente está connosco!

 

 



[i] Referência ao tema do Chico Buarque de Holanda, “Tanto Mar”, na sua 2ª versão, publicada no ano 1978, no albúm “Chico Buarque

[ii] Referência ao tema do Zeca Afonso “Os Índios da Meia-Praia”, do albúm “Com as Minhas Tamanquinhas”, do ano 1976


This page is powered by Blogger. Isn't yours?