21 abril 2021
O VELÓRIO DA CULTURA
Vale a pena morrer, para haver velório?
Claro que nele cabe, segundo a tradição africana, uma grande festa, com comes e bebes, canto e dança, batuque à farta, que o morto merece e os que ficam lhe prestam a homenagem que se calhar nunca teve em vida, que cheia deve ter sido, uma festa que só agora tem e não pode ver. Mas podemos nós, que lembramos e assim lhe tributamos, em honras e memórias, a vida que também partilhamos.
Há até quem acredite que neste século vai ser possível digitalizar a informação do defunto e usá-la para recriar a sua consciência. Talvez da Cultura fique esta “deliciosa” reminiscência, do que era, do que foi e de como a poderemos recriar.
Queremos recriá-la?
Podemos recriá-la?
Oh, velório, que mostras o defunto e dizes “E se tivéssemos ficado sem...?”.
Que bem se comportam as pessoas no velório, em princípio não lhes sai da boca impropério algum, (por bem que apetecesse).
Apenas estão velando o “corpo das artes”, assim exposto à comiseração.
Mal vai um País que deixa assim morrer o que de melhor tem para dar e assim morrendo, já dar não pode.
Quase agora me lembro de um ex-presidente de Câmara que, quando lhe falavam em Cultura, mexia no bolso, a ver se aparecia algum tostão. Gozava estaria, ou estava mesmo, agora já é presidente de um grande partido, as coisas são assim, não há que ter vergonha, embora fosse de haver. Mas não há.
Agora velamos.
Quedamos em saber o que vem por aí.
Entretanto, sem qualquer augúrio, ao velar a Cultura, podemos estar a velar um País.
Cidadão atento!
(roubo sempre esta asserção a um velho Amigo...)