04 julho 2010

Ao meu Amigo ZeTó
























Uma cidade de azul pintada
, aqui e além “um céu de palavras paradas”, esperando sorrisos, mãos que se apertam, outras que se desencontram, um misto de cheiros, cores e poemas. E quadros que alguém sempre vai pintando, avisando a nossa memória colectiva, baralhando sons que se misturam, que nos alertam para a vida que vale a pena. O artista, “Cavaleiro”de “Montanhas”, sempre “O Pensador” da cidade das “praças de palavras abertas”, atento a todos os desvios, “à procura da sombra de uma luz que não há” . Porque se desprende dos ambientes do fausto, volta às origens “...já o meu pai pintava”, conhece novas realidades que transmite á sua obra, um “Encontro” com as suaves presenças de uma Angola recente que marca as pessoas, porque as pessoas marcam mesmo quando são distantes, a distância que importa? Ao "Ego declara Morte", alguma coisa tem que se apagar, renascendo porém a cada momento na dialéctica permanente da cidade, passa as palavras para a tela, reinventa poemas em aguarela e acrílico, “… não há céu de palavras que a cidade não cubra”.

A cidade Vive, pensa e luta, espera palavras novas em tempos difíceis, os “Nascentes” , as novas esperanças de “Campos de Flores”, de brilhos intensos, de sensações profundas, de cumplicidades óbvias. Sempre buscando o “Encontro”?

Colaboração:
• palavras do Zeca Afonso
• palavras e títulos das obras do ZéTó Passos, em Exposição no Museu Bernardino Machado, V. N. de Famalicão



02 julho 2010























Há cerca de 2 semanas, o País conheceu os resultados de uma sondagem efectuada por organizações governamentais e não-governamentais (1), em que sobressai um inquérito sobre a “satisfação dos portugueses”. Curiosamente (ou não) ficou a saber-se que, apesar de todos os constrangimentos, apesar da crise inventada pelo sector financeiro, apesar dos PECs e outras medidas que Governo e acólitos “montaram” para satisfazer os ditames dos alemães que “governam” (desgovernam) a dita União Europeia, os portugueses estão “satisfeitos”. Ainda que moderadamente. Aliás, este termo é mais que isso, é um conceito inculcado desde várias décadas, cuidadosamente modelado, trabalhado e difundido, servindo até para caracterizar um povo “habituado” a que lhe malhem em cima: moderação, brandos costumes, o povo é sereno. Os Governos, desde 1975, sempre da mesma cor política, oscilando entre o rosa-pardo e o laranja-desbotado, misturados, aliados ou em (falsa) alternativa, lavram de forma exemplar o conceito, traduzido no centrão politicamente correcto: sentido de estado, sentido de responsabilidade, equilíbrio, reformas moderadas, …, um caldo de cultura de adequação e resignação. Os resultados aparentemente não interessam, quer dizer não contam, não são mensuráveis. A interpretação da realidade é tão falaciosa como no futebol. Queirós é um lídimo exemplo, porém apenas um vulto na paisagem do centrão, a imagem do FALHANÇO; satisfeito, porque em 4 jogos a selecção só sofreu 1 golo (com Espanha) e marcou 7. É verdade, é uma interpretação da realidade; se lhe dizem que em 4 jogos só ganhou 1, outra interpretação da realidade, ele não aceita, porque está vinculado à primeira, à dele. Não joga para ganhar, nunca irá ganhar coisa nenhuma, porque interpreta os factos com base “no tal” conceito. Não arrisca, não joga ao ataque, só vê estrelas Ronaldo, de outro firmamento que não o nosso, não vê Fábios, Eduardos, Raules, que jogam (eles sim) para ganhar; será por acaso que Ronaldo é a imagem de um Banco muito conhecido, que tem um “feeling”, o verdadeiro, que o seu dinheiro vale não-sei-quantos-mais-por-cento?
O mesmo FALHANÇO de um Governo á deriva, ou se quiserem, derivando sempre para o mesmo lado, o da direita pois, que quer ainda mais e mais capitulações. Tal como Queirós, não joga para ganhar, aposta em 3, 4 ou mesmo 5 centrais, o centrão de novo. Não sabe (não quer) interpretar a realidade que mostra um País nos primeiros lugares das listas da pobreza extrema, dos baixos salários, dos combustíveis mais caros, dos IVAs mais altos …E nos últimos lugares da qualificação profissional, da distribuição da riqueza, da injustiça fiscal, da injustiça na justiça, …Da mesma forma que Queirós, vê como positivo, no que reporta a baixar o défice, ir ao bolso dos portugueses para “arranjar” 3 mil milhões de euro para “salvar o País”: é uma interpretação da realidade. Contudo não vê (não quer ver) que foram gastos 5 mil milhões de euro para tapar o buraco do BCP, BPN, BPP, salvando assim o País. Aliás, parece também não ver (não querer ver) que, só no 1º trimestre de 2010, os bancos apresentaram 3 mil milhões de euro de lucros diários, pagando ao Estado metade do que uma empresa “normal” paga.

Talvez a putativa “satisfação dos portugueses” seja algo positivo porque lhes permite viver a crise dos ricos com um sorriso, ao invés de contrair uma qualquer depressão, que os arrastaria para o buraco negro da psique, dispensando desta forma anti-depressivos e ansiolíticos que nunca poderiam comprar, dado que teriam de ser prescritos por um especialista a quem nunca poderiam pagar. Esta é uma interpretação possível do citado estudo. Contudo, uma outra (interpretação) dita que, tal estado de espírito pode significar uma relativa “impotência” para agir, para se indignar, enfim para se revoltar...

No dia em que aumentam os transportes, a alimentação, os medicamentos, o IVA e o IRS e, consequentemente o custo de vida e a diminuição do poder de compra, será que os mesmos portugueses ainda estão “satisfeitos”? Havia talvez que repetir o inquérito, possivelmente com um exercício prévio: um mês em que fosse possível calar as vuvuzelas da propaganda oficial, repetida vezes sem conta por uma comunicação social a mando dos ricos e poderosos; um mês, uns singelos 30 dias, sem a repetição exaustiva dos comentaristas de serviço que dizem invariavelmente o mesmo (por vezes disfarçados com uma linguagem muito português suave…) , dando voz aos que nunca governaram, aos que nunca decidem nada, aos que nunca tiveram voz; uma outra interpretação da realidade. Apenas e só um devaneio, um sonho, tal nunca seria possível; pelo menos de forma pacífica…

Algo porém anda há muito tempo escondido, um sentimento de revolta contra a inevitabilidade, que só mesmo a luta poderá quiçá reinventar. Senão estaremos sempre condicionados por uma única interpretação da realidade. Este Governo e outros do género centrão coloridos, serão sempre como Queirós: nunca vão ganhar nada, porque as pequenas “vitórias” que possam alcançar, são iguais ao zero-a-zero de Queirós, vitórias de Pirro, cujo fulgor se apaga no empate ou na derrota seguinte, que ditam forçosamente a eliminação, que aqui tem o significado malévolo de eliminar (leia-se excluir) de facto mais algumas e mais alguns. Ganhar significa correr riscos, Queirós não sabe (não quer) correr riscos, não faz as substituições adequadas, na altura certa, para dar uma cara nova à equipa. O Governo não quer correr riscos, não taxa a Banca como se impõe, não quer combater a especulação, nem a fuga de capitais para as off-shores; não quer valorizar o trabalho, condição indispensável para o desenvolvimento económico; não quer ver a realidade que prova que o dinheiro dos salários dos trabalhadores dinamiza o mercado interno. Queirós empata os jogos, o Governo empata os portugueses com um discurso da moderação e da consequente resignação. Queirós, ao querer empatar, perde tudo. O Governo, ao querer empatar os portugueses, vai perder o (muito) pouco que conseguiu. Queirós não se demite, porque acha que não perdeu. Sócrates também não se demite, porque considera que ainda pode ganhar alguma coisa (…).
Ambos estão enganados. Uma outra interpretação da realidade irá acabar por demonstrar isso mesmo. A pretensa “satisfação” dos portugueses poderá transformar-se a todo momento em indignação generalizada e na revolta de consciências mais que necessária à transformação social.

Hoje foi dia para reflectir. Nada melhor que sentir na pele o aumento do custo de vida, para acordar da letargia e passar ao ataque. Nem que para tal seja necessário recorrer à falta, ao tal cartão amarelo cirúrgico para impedir o avanço ao golo. E mesmo que a acumulação de amarelos impeça de jogar 1 ou 2 partidas, vale a pena arriscar. Porque a melhor defesa é sempre o ataque!

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(1) “Necessidades em Portugal: Tradição e tendências emergentes”, por TESE, Instituto de Segurança Social, Centro de Estudos Territoriais (CET/ISCTE), Fundação Calouste Gulbenkian e Young Foundation

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