19 fevereiro 2017
O QUE É UM JALALI (?)
Não, não é engano. Não é “javali”, não é “vou já ali”. Nada disso.
Explico que se trata de uma espécie em vias de ascensão, ou mesmo já devidamente
ascensionada.
Porque alguém assim quis, o jalali[1]
aproveitou o ensejo e, cheio de ciência empacotada da politiquice, traçou um
percurso académico porventura eivado do sucesso fátuo da oportunidade, surge no
espaço hertziano, fala suave, diz pouco ou quase nada, como acontece com quase
todos os primatas que habitam o tal espaço, agora privado e suportado por
grandes e poderosos donos do capital e da capital e arredores.
O jalali vomita lugares-comuns povoados de coisa nenhuma e dita, não do
alto da cátedra, mas do lado de lá do microfone, uma verborreia pastosa, onde a
mediocridade é um epíteto suave para classificar a mesquinhez mais tacanha.
(Isto é o jalali)
É ouvi-lo na electromagnética frequência, convidado de “fóruns” que são
assim uma coisa mal parida, onde se decreta que “…a voz é dos ouvintes”, mas que é sempre antecedida de um monólogo
de uns “escassos” 15 a 20 minutos de um “especialista”. Para “animar”, dizem
eles, a “discussão”.
E aqui reina um qualquer jalali.
Fala num tom monocórdico, um discurso paternalista e padrético, uma cândida
voz, segura na sua visão cinzenta do mundo, projectada no fundo da caverna, que
Platão ilustra[2],
quando fala das sombras que parecem mais verdadeiras do que os objectos. Que acontecerá
ao jalali, quando o tirarem da caverna do estúdio?
Entretanto vai vomitando insignificâncias, com a tranquilidade olímpica
de quem tem audiência garantida, a troco de alguns patacos, que usa para polir
a mais rasteira e bafienta postura.
Numa manhã perto de si, o jalali aparece sempre protegido debaixo da capa
de “politólogo”, a tal espécie recentemente inventada e que serve fundamentalmente
para classificar incertos e indeterminados indivíduos que interpretam uma realidade
que arquitectaram para si próprios. Em pleno século XXI, um politólogo, vale muito
mais que um astrólogo, que um psicólogo, ou até mesmo que um metodólogo.
O jalali articula o conhecimento ao nível do pequeno burguês, sentado no
barbeiro (agora diz-se cabeleireiro), enfarinhado na “Maria” ou na “Nova Gente”
(não sei se agora se chamam assim…).
O jalali fala do “papão” do populismo como a beata fala do inferno. Sem qualquer
base de sustentação que não seja a sórdida posição redonda do “moderno” sistema
de análise que simplisticamente caracteriza as mentes balofas de uma Direita
anquilosada, o jalali deriva para cima e para baixo e ainda para o lado (direito,
claro) no que é de facto o populista. Curioso, ou nem por isso?
Entretanto, as mentes menos sadias e mais dadas à magia efémera das novas
tecnologias ditas libertadoras, efabulam um jalali e exultam com as suas
derivas. Crescem em número, que não em qualidade, postulam verdades mentirosas
e compram (e vendem) a não-ideologia.
Talvez não lhes
fizesse mal nenhum ler alguns livros, sobretudo daqueles que houvessem constituído
“…uma riqueza para quem os tenha lido e
amado”[3].
Todavia não parece ser essa a vocação dessa espécie.
Pior para os
seus representantes.
Atenção para nós
que a repugnamos e à qual não queremos pertencer.
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NOTA: Este texto é especialmente dedicado ao meu
Amigo Licínio Lima, que dedica sempre alguma atenção a ler as minhas
crónicas, “perdendo” eventualmente tempo que poderia ocupar em tarefas bem mais
profícuas (digo eu…)
[1] Uma personagem inspirada no senhor Varqa Carlos Jalali, Professor Auxiliar da Universidade de Aveiro, Diretor
do Programa Doutoral em Ciência Politica (UA-UBI), Diretor do Mestrado em
Ciência Política e Coordenador do grupo de investigação em Políticas Públicas
Instituições Inovação (PI2) do GOVCOPP (fonte Universidade de Aveiro, in: https://www.ua.pt/dcspt/person/cjalali
[2] Referência à obra “A República, Livro VII”, de Platão (século
IV A.C), considerado um dos suportes básicos sobre Teoria do Conhecimento
[3] Referência à obra “Porquê ler os Clássicos?”, de Italo
Calvino, (1991), 4-5
13 fevereiro 2017
“A RÁDIO É VOCÊ!”
Foi assim mesmo que em 2011, o 13 de
Fevereiro foi proclamado pela UNESCO, o Dia Mundial da Rádio.
É dentro da rádio, uma vez que estamos dentro dela ou está vem ao nosso
encontro, dia a dia, hora a hora, minuto a minuto, sempre que a deixamos
entrar. “A rádio vê no escuro” diz o meu Amigo Fernando Alves, ele que é (para
mim) uma voz e uma presença inesquecível e que semeia diariamente o
desassossego nas manhas da rádio. Apetece diz, pois vê!A rádio está onde deveria estar ou apenas está porque quer estar?
A rádio é também, muitas vezes, uma cúmplice do pensamento dominante. Quantas vezes aconteceu, outras vezes (lá está uma vez mais o escuro) a ouvimos no silêncio das noites do medo, confortando a esperança e atiçando a revolta.
Quero pensar no que a rádio contribui para a
minha (e para a de muitos) formação integral. Nos tempos da escuridão (lá está,
o escuro) a rádio era “Em Órbita”, era “Página 1”, era “Limite”, era tantas
coisas que nos sussurrava e assim ia plantando em nós o vício da contestação,
do contraditório que não havia, e sim, da revolta contínua. Porque havia rádio,
aquela coisa que se ouve alto e baixinho, consoante nos dá gozo ou nos é
permitido.
A rádio
que diz, na madrugada gloriosa, “Aqui, posto de comando do Movimento das Forças
Armadas…”, é o Furtado, sim. É Abril, é a Liberdade, pois então. A rádio é o direito das pessoas à
informação, um direito que deve ser protegido e acarinhado. E estudado também.
A rádio
salva vidas. E pode também promover e capacitar as pessoas mais vulneráveis e
mais sujeitas a desvarios de poderes, mesmo de alguns, supostamente
democráticos.
A rádio és tu!
Sabe-se
lá como, mas tu estás lá, agora em tempos de meia-verdade ou mesmo de “falsa
verdade”. Porque és uma peça do enorme círculo, onde campeia muitas vezes o
silêncio ajustado de uma TINA qualquer.
“As
rádios são casas onde as palavras ganham asas…”, uma vez mais me socorro do
Fernando, porque é mesmo assim, porque é língua e movimento.
E sonho,
também.