29 janeiro 2021

 PRESIDENTE DA REPÚBLICA: UM PROJECTO PARA O PAÍS?

 

Quem luta, pode perder. 

Mas aquele que não luta, já perdeu

Bertholt Brecht

 

Tenho seguido, com a maior atenção, os escritos e as crónicas das rádios e TV, a propósito dos resultados das eleições presidenciais. Comentários que me merecem todo respeito e consideração, em particular daqueles que o merecem. De uma forma geral, constato alguma convergência e similitude com o que penso.

Tomo por base três conceitos da avaliação de projectos, para uma breve análise das eleições de Domingo passado e da sua potencial influência, no possível desenho de um projecto para o País. Reputo como fundamental a existência de tal projecto, bem como da importância de ser a Esquerda a propor e a protagonizar a sua possível implementação. Porque, a não ser assim, e a propensão da Esquerda em continuar a viabilizar as propostas (e mesmo a governação) do Partido Socialista, tudo continuará mais ou menos na mesma, arrastando o País para o marasmo habitual, e a consequente degradação das situações política e social. 

Os parâmetros que vou utilizar nesta análise, são a relevância, a eficácia e a sustentabilidade. Qualquer deles faz parte da avaliação de um projecto. É com base na apreciação de cada um, que é possível qualificar e quantificar o valor do mesmo e, em casos específicos, determinar se o projecto deve ser (ou não), objecto de financiamento.

 

A Relevância 

Precisamente por ser relevante, o que afirmo atrás, este parâmetro de avaliação é de primordial importância. E, para começar, começo por colocar a questão seguinte: qual dos candidatos apresentou um projecto relevante? A resposta a tal questão é, para mim, bastante óbvia. Só existiu verdadeiramente um projecto relevante para Presidente da República e foi protagonizado por João Ferreira. Claro e preciso, foi até alvo de elogios por parte de insuspeitos comentadores da nossa praça. Mereceu até o epíteto de “Candidato da Constituição”. Nenhum dos concorrentes apresentou uma proposta com a relevância daquela. E, alguns dos candidatos, não apresentaram sequer um projecto, digno dessa significância. 

Num projecto, a relevância é medida pela pertinência em relação a alguns sub-parâmetros, como por exemplo, necessidades e limitações, tipologia dos participantes e beneficiários e outros elementos de valor acrescentado, dos quais destaco, pela sua aplicabilidade, as condições de vida, habitação, educação e saúde das populações, as necessidades de pessoas com deficiência, os direitos das minorias,. Mesmo sabendo que não é o Presidente que governa, basta dizer que é a ele que compete a fiscalização e a promulgação de leis e diplomas, para perceber o alto significado do projecto do Presidente da República. E da sua relevância.

 

A Eficácia

O “prémio”, a que reporta este parâmetro vai direitinho para Marcelo. Na verdade, sem fazer campanha, abdicando de tempos de antena, fugindo sistematicamente a discutir fosse o fosse, distribuindo elogios e sorrisos por quase todos os concorrentes, desarmando os adversários, driblando o confronto e preferindo a concordância com cada um, subestimando a sua própria candidatura, porque era afinal ele, o Presidente em exercício. Mesmo que acordemos em dizer que Marcelo desvalorizou completamente o acto eleitoral, temos de concluir que essa possível “estratégia” resultou em pleno, indo até ao limite de votação, que terá ultrapassado mesmo as melhores expectavas. Na prática, conseguiu uma votação, em números e em percentagem, superior à da primeira eleição, o que não deixa de ser notável. 

Em nome da Eficácia, supõe-se que seja respondida a pergunta, os resultados desejados estão a ser alcançados? Assim sendo, em breve o saberemos, com Marcelo reeleito e agora na posse de uma maioria significativa, que possa até dar corpo a uma qualquer recomposição da Direita, esfrangalhada nesta eleição, sem um líder capaz e reconhecido, pelo contrário, parecendo ser refém de um arrivista, com contornos fascizantes e de duvidosa reputação.

 

A Sustentabilidade.

Manda o critério, que seja possível saber até que ponto e de que forma, o impacto do projecto é (ou não) sustentável. Exige-se ainda que a proposta apresentada seja de tal forma convincente, que leve um possível financiador a apostar no projecto, desde que fique amplamente demonstrado que o desenvolvimento posterior de actividades consegue “sustentar” a proposta, de tal forma que o projecto continue o seu caminho, mesmo depois de o financiamento terminar. Aqui impõe-se dizer que talvez não tenha estado em jogo, um verdadeiro projecto sustentável, que a existir, seria o garante de uma estabilidade política, tão a gosto do centrão partidário, que o Partido Socialista insiste em corporizar, mesmo sem “parceiro” conveniente. Não, de facto não tivemos um projecto sustentável para o País e é deste ponto que quero partir, para afirmar que somente a Esquerda pode fazê-lo, ainda que não estejam ainda reunidas as condições subjectivas, para que tal aconteça. 

Alguém então se quer “atravessar”, para financiar este projecto, deste Presidente, ainda que impondo regras e critérios rígidos, para acautelar um desempenho dos actores envolvidos?

Apenas a evolução dos acontecimentos, particularmente neste tempo de incerteza permanente, no curso de uma pandemia que teima em manter-se, poderá avançar uma resposta. Só que este não é um projecto qualquer, um mero exercício de actividades. Aqui joga-se a sobrevivência dos cidadãos, em que uma parte significativa está, de há muito tempo a esta parte, sistematicamente a perder direitos e possibilidades de ter uma viga digna. Haverá, a história assim o diz, quem se aproveita da situação, para lançar a confusão, o pânico, o medo, semeando o ódio e propondo confrontos de difícil previsão.

 

Será mesmo “isto” que os portugueses querem?

A resposta a esta questão provavelmente não existe.

Existem, isso sim, algumas aproximações que, deveremos considerar como pontos de partida para o debate, para o diálogo entre actores diversos, para convergências (mesmo que de ocasião), para o desenho de algumas prováveis soluções, ou no mínimo, para conseguir que os actuais intervenientes no campo da Esquerda, aceitem vir ao terreno, ainda que “agarrados” a uma qualquer agenda de circunstância.

Pode perguntar-se ainda, como aliás o fizeram alguns comentadores políticos, qual a verdadeira intenção de milhões de pessoas que saíram de suas casas, onde estão confinados, para ir exercer o seu direito de voto? Qual o sentido do seu voto? Como distribuíram as suas “preferências”, sobre as propostas que ouviram dos candidatos? Se porventura mudaram o seu voto, após o decurso de uma campanha atípica? Poderia multiplicar aqui este exercício, por grupos etários, por distritos, por concelhos, etc..., etc... Certamente veremos trabalhos específicos, nomeadamente académicos, nesse e noutros sentidos.

Todavia, há questões que nos assaltam. Uma pessoa, um cidadão, uma família, que ganha o ordenado mínimo, para sustentar uma casa, que vê esse salário (quando existe, claro) subir apenas uns míseros euros, enquanto as coisas que precisa comprar, os serviços que pensa adquirir, aumentarem todos os anos de tal forma que a sua vida, a vida dos seus, não tem forma nem rumo, não podem pagar, não podem poupar, não podem ir a um teatro, a um cinema, a um espectáculo, a casa onde vive (se casa for...) não tem condições para se protegerem, para se aquecerem do frio e da chuva. Que podem pensar? Que e como podem decidir, quando o Estado não cuida de si e dos seus? Que ouvem, que vêm um governo fazer, para melhorar (ainda que apenas um pouco) a sua condição?

Será que, num estertor de fúria se viram para alguém que, apesar de não lhe prometer coisa alguma, fala do Poder como um conjunto de bandidos e de culpados que apenas pensam em se manterem lá, para se servirem dos cargos e possivelmente enriquecerem, à custa de malfeitorias várias? 

As políticas de tibieza até agora levadas a cabo, com pequenos avanços ao sabor de correntes de ocasião, sempre com recuos, quando se tratar de afrontar (quer dizer, de não afrontar) os interesses rentistas habituais, só podem conduzir ao estado em que ora nos encontramos. 

Aí, a questão que coloquei, pode adquirir uma importância devastadora. 

 

Há um projecto para o País?

O País pode ser um projecto, mas para isso precisa de autonomia, que, em termos da Constituição da República, adopta a designação de Soberania.

É mesmo muito difícil encontrar uma saída (airosa?), sem abordar de frente, com a tal frontalidade que se exige, sem deixar de lado a ideia, o conceito, o significado verdadeiro de soberania.

Aqui a interpreto como verdadeira alternativa. 

Aqui a deixo para reflexão, a quem lhe queira pegar. Sem receitas, sem preconceitos.

Passa (deve passar), em primeiro lugar pela definição de uma estratégia. Uma estratégia de Esquerda. Ou, se preferiram, das Esquerdas. 

A definição de uma estratégia para o País será a melhor das respostas que a Esquerda pode dar. Até porque, o que falta ao País é, sem qualquer dúvida, uma estratégia. Que o governo actual não tem, nunca teve, nem nunca terá. 

Para tal, será necessário, antes de mais, encetar um diálogo com todos aqueles, pessoas individuais, associações e cooperativas, organizações sociais, empresas e sindicatos, partidos políticos e outras entidades, que fazem da Cidadania, a sua verdadeira função. Sem querer citar aqui nenhuma, sempre digo que todos as conhecemos, “passamos por elas”, reportam-nos a elas, citámo-las tantas vezes. Talvez seja a hora de as convocarmos.

Quem terá a “coragem” necessária para fazer isto?

Talvez seja a hora, finalmente, de pensar que vale a pena.


23 janeiro 2021

 PLEASE, COME TALK TO ME




O mundo de cada um é os olhos que tem
José Saramago, Memorial do Convento, 274 (1982)

 

O meu é hoje, interdito e circunscrito, esperando melhores sortes. Aproveito o ensejo, meu Caro Amigo, “...o que eu quero é lhe dizer que a coisa aqui tá preta”. Sim, “...Aqui na terra 'tão jogando futebol/ Tem ...muito choro.../Uns dias chove, noutros dias bate sol”. Falta-nos, é verdade, samba e o rock'n'roll. Falta-nos também a morna, a salsa e o eterno tango, num corridinho de movimentos perpétuos, uma dança. A menina dança? 

Sinto falta de inteligência, sem ser artificial. E de sabedoria também. Recorro ao Eco, ao Saramago, ao Torga, sei lá a quantos mais. Calvino e Mann, talvez. Os Poetas, quiçá. Yeats e a sua sabedoria e rebeldia, “...A sabedoria é uma borboleta/Não uma sombria ave de rapina”. Ou esta, “Oh, há sabedoria, sim,/Naquilo que os sábios diziam;/Mas entra essa corpo por instantes/E deixa passar a tua cabeça/Até que eu tenha contado aos sábios/Onde acha o homem o seu consolo”.

Podes falar comigo?”, diz e canta o Peter, que tem sabedoria e inteligência, coisa que parece não abundar por aí. “…Come down, come talk to me/In the swirling curling storm of desire /Unuttered words hold fast/With reptile tongue, the lightning lashes/Towers built to last/Darkness creeps in like a thief

O medo do escuro, que falta me faz o contacto, a cena do abraço, que estreita o que há de melhor em nós. Rir, dançar e recusar o óbvio e o redundante. Talvez desobedecer. O sentido da obediência traduz-se, segundo Frédéric Gros, em uma “...relação que forças a agir segundo a vontade doe um outro, de modo que, quando ajo permaneço passivo”.

No dia em que nos “convidam” a alguma “passividade”, saibamos desobedecer, sejamos (ainda que um pouco) insubmissos, o dom da eterna liberdade de pensar, agir e intervir na comunidade. Manda a sanidade mental, a inteligência.

Eu quero apenas ser cruel naturalmente/E descobrir onde o mal nasce e destruir sua semente”.

O canto doloso dos profetas, ditos salvadores, enleado na teia “enternecedora” da obediência, não é para aqui chamado. Deixa-me rir, “Pois é, pois é/Há quem viva escondido a vida inteira/Domingo sabe de cor o que vai dizer/Segunda-feira”.

É já amanhã!

 

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Contribuições, ainda que involuntárias, de José Saramago, Chico Buarque de Holanda, Peter Gabriel, William Butler Yeats, Frédéric Gros, Ivan Lins e Jorge Palma.


17 janeiro 2021

 VOTO JOÃO FERREIRA!


 
















A última coisa que esperaríamos confinar seria mesmo a esperança.

 

Por isso, hoje, no dia em que se antecipa o voto nas eleições presidenciais, deixo aqui o meu apoio ao JOÃO FERREIRA.

 

Porque dele espero, a defesa, o aprofundamento e ampliação do regime democrático consagrado na Constituição, como se pode ler na declaração de princípios da sua candidatura.

Porque considero fundamental combater o medo, que como ele afirma, “...é exacerbado e manipulado para restringir direitos e liberdades. A pretexto do combate ao vírus e da garantia de uma alegada “segurança”, impuseram-nos estados de emergência que nada tinham a ver com a observância de normas que a população já cumpria (e continuou a cumprir depois de abandonados), mas que visavam restringir o protesto e a luta, contra os abusos, os aproveitamentos, o oportunismo dos que querem continuar a enriquecer à custa da exploração dos trabalhadores e do saque dos recursos do Estado.”

Ainda, as suas palavras: “...Num mundo onde se tenha acabado a esperança, como o retratou Saramago no seu “Ensaio sobre a cegueira”, deixamos de olhar para o futuro, deixamos de o ver. “A cegueira também é isto”, dizia.”

 

A defesa da Constituição que, no seu Art.1º, consagra o nosso País, como uma “...República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.”, tem no JOÃO FERREIRA, a melhor e mais correcta interpretação

É na luta por uma Esquerda que terá a verdadeira maioria, quando souber assumir a defesa do País, enquanto República Soberana, quando denunciar eficazmente as políticas económicas de empobrecimento e miséria, mascaradas de soluções tecnocratas, quando apresentar soluções credíveis, entendíveis e viáveis, que deixem sem resposta os falsos profetas e aqueles que querem hoje falar em nome do povo.

 

Por isso e pela “...força que há em todos, em cada um de nós”, o meu voto e o meu apelo: Vota JOÃO FERREIRA!

 

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Nota: todas as citações são extraídas da Declaração de Candidatura de João Ferreira, disponível em: https://www.joaoferreira2021.pt/declaracao-de-candidatura

 

 


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