19 fevereiro 2022

 EXPLORAÇÃO DE LÍTIO
(ou a dupla face da “inevitabilidade”)


 

Numa altura em volta a falar-se na exploração de lítio no nosso País, com evidentes prejuízos para as populações, para o meio ambiente e para a economia, tem algum sentido abordar a questão: porquê esta “febre” das autoridades portuguesas, será que vale mesmo a pena levar a cabo a exploração do lítio? Ou será que existem interesses, na retaguarda, a justificarem a medida? Cabe nesta análise, necessariamente breve, a consideração de razões científicas, técnicas e tenológicas e a necessária abordagem económica.

 

Breves referências científicas

O lítio pertence ao grupo 1 da tabela periódica, apresentando algumas propriedades químicas e geoquímicas semelhantes ao conjunto dos metais alcalinos. Sob condições normais de temperatura e pressão, é o metal mais leve e menos denso entre os elementos sólidos. Segundo Jeppson (1978), é encontrado, na maioria das vezes, na condição de composto químico iónico e não no seu estado nativo, devido à sua elevada reactividade. Trata-se de um metal escasso, que se encontra disperso em certas rochas, em sais naturais, águas salgadas e águas minerais. As grandes extensões salgadas, da América do Sul, regiões que há́ dezenas de milhares de anos eram cobertas por oceanos e que acabaram por secar formando desertos de sal, são uma das principais fontes de extracção de lítio. A outra fonte é representada pela extracção de depósitos minerais, através de minas, como é o caso do nosso País. Esta exploração é feita nas rochas pegmatíticas que hospedam, por assim dizer, os minérios de lítio, entre eles o espoduménio. Uma das particularidades científicas mais importantes a considerar na exploração e produção do lítio é a dos custos dos processos de fabrico, que está ligada à relativa complexidade do processo. Enquanto o lítio nas salmouras já está numa forma solúvel em água, exigindo apenas operações de concentração (evaporação por meio de energia solar) e purificação, nos minerais dos pegmatitos são necessárias uma série de operações de mineração, concentração física, conversão térmica e reação química, até se conseguir obter o lítio numa forma solúvel, tornando, segundo Lima, A. (2000), incontornáveis os custos acrescidos, muito particularmente, nos consumos de reagentes químicos e de energia.

Em Portugal os recursos de lítio são utilizados sobretudo na indústria da cerâmica. Contudo, desde há uma década que tem sido colocada a hipótese de extracção do metal para outras aplicações, nomeadamente na produção de baterias, para fins industriais, telemóveis e veículos eléctricos. 

 

Um “estranho” percurso: a febre do lítio em Portugal

O lítio parece ser, nestes tempos, um recurso mineral com muita procura. De facto, o nosso País tem sido apontado como sendo o 6º produtor mundial, atrás, por esta ordem, de Austrália, Chile, China, Argentina e Zimbabué. Relativamente a valores em jogo, medidos em toneladas, enquanto o 1º produtor (Austrália) apresenta quase 59 mil, Portugal tem apenas 800. Na verdade, existe uma enorme disparidade de valores, e mesmo o Chile que é de momento o 2º produtor mundial, oferece ao mercado um valor que é 3 vezes e mais inferior ao do 1º. A China e a Argentina (3º e 4º, respectivamente) quase se equivalem na produção: 7 mil e 6,4 mil. O Zimbabué produz o dobro de Portugal (1,6 mil). Em Portugal, as seis principais ocorrências de lítio localizam-se em Serra de Arga (dividida pelos concelhos de Caminha, Ponte de Lima e Viana do Castelo), Covas do Barroso (Boticas), Barca d'Alva (Figueira de Castelo Rodrigo), Guarda, Mangualde e Segura (Idanha-a-Nova).

O mercado das baterias de iões de lítio, para aplicar nos telemóveis e nos computadores, tem crescido nos últimos anos, tendo a Reuters avançado um crescimento do mercado de 18,7%, ao ano. O interesse pelo lítio português parece ter despertado em 2016, ano em que deram entrada 30 novos pedidos de prospecção e pesquisa do metal. Com os protestos, de secretaria e de rua, contra a prospeção e exploração de lítio, da parte de associações ambientalistas, autarquias e cidadãos, o Governo defende que a medida é recurso essencial para a “transição energética”.

Em finais desse ano assinala-se que as mais de 50 perfurações realizadas em Cepeda, Montalegre, detectaram a existência de jazidas estimadas em 10,3 milhões de toneladas de pegmatito, onde se encontram concentrações de 1% de óxido de lítio e de 0,05% de estanho. É precisamente em Dezembro de 2016 que surge o designado Relatório do Lítio, identificando zonas com “elevado potencial”, particularmente nas regiões Norte e Centro e com o maior volume de investimentos anunciados, em Montalegre (Sepeda-Barroso-Alvão e Covas do Barroso-Barroso-Alvão) e em Viana do Castelo (Serra da Agra) e ainda as zonas de Amarante Seixoso-Vieiros, Murça, Penedono, Almendra, Barca de Alva-Escalhão e Massueime. A maior das áreas é referenciada na zona de Gonçalo-Guarda-Mangualde e na Beira Interior Argemela (Covilhã) e Segura (Castelo Branco) e ainda Portalegre. 

 

Papel do lítio na “transição energética” – uma falácia

Apresentar o lítio como a única hipótese viável para diminuir as emissões de CO2, de forma simplista como o fazem a grande maioria dos comentadores e o próprio Governo, é tentar combater as alterações climáticas, criando novos problemas ambientais. Ao fim e ao cabo é tão somente contribuir para perpetuar a lógica da acumulação da riqueza na mão de uma minoria, com base nos recursos comuns, que pertencem a todos.

A dimensão do Projecto Lítio contrasta com a realidade do nosso País.

A propalada tese que possuímos a maior reserva europeia de lítio, tendo assim uma grande vantagem estratégica face a outros países, é simplesmente enganadora. Os países europeus que detêm as maiores reservas são a Sérvia, a República Checa, a Áustria e Roménia, cujas populações parecem estar interessadas na possibilidade de uma futura exploração, dado que um projecto desta envergadura poderia contribuir decisivamente para o emprego. 

Mesmo que as reservas que Portugal possui fossem significativamente importantes, pelo mesmo em quantidade, tal não significa uma garantia directa de competitividade, num mercado internacional dominado por grandes produtores.

O professor Carlos Leal Gomes, da Universidade do Minho classificou como um “quase-delírio” o projecto que o Governo continua a “vender” à opinião pública. Na verdade, cavar até 350 metros (Montalegre) não é mais que “roubar” toda a riqueza mineralógica existente, sem quaisquer contrapartidas às empresas extractivas. Mas é um conjunto de arbitrariedades, que começam no completo desprezo pelo património e uma brutal agressão ambiental, para além dos riscos de contaminação e de impacto sobre as águas. Um exemplo bastante elucidativo da falácia: os filões que se conhecem até agora apontam para uma dimensão de 10 por 250 metros, com um teor de lítio de 1%, enquanto na Austrália, por exemplo, existem filões de 1000 por 800 metros com um teor de 5%.

A falácia suprema, assunto para outra crónica, é sabermos hoje que já estão a ser desenvolvidas alternativas às baterias de lítio, que não têm uma reciclagem fácil.

 

A questão central: vale a pena esburacar o País?

A sociedade moderna tem os seus desafios. Alguns deles implicam mudanças significativas na forma como gerimos os recursos naturais. Neste caso particular, da exploração do lítio, ainda é escasso o conhecimento disponível, particularmente no que reporta aos fluxos de energia e matéria que suportam a economia física. Para o economista romeno Nicholas Georgescu-Roegen, os processos de produção da sociedade industrial moderna provocam grandes atritos sociais e, em consequência, há́ dissipação dos recursos da economia, pois, parte de tais recursos deve ser usada em actividades improdutivas.

No limite, parece ser esta uma premissa importante da questão: na realidade, a sociedade vê sobretudo uma grande desvantagem da exploração do lítio. A avaliar pelas movimentações cidadãs que atravessam o País, de Montalegre à Serra de Arga, de Barca d’Alva a Mangual e à Guarda, até Idanha-a-Nova e que se manifestam na defesa da Vida, da qualidade da água e do próprio ar que respiram. E nem a promessa vã de mil e um empregos as satisfaz, sobretudo depois de terem conhecimento dos prováveis malefícios da exploração. E não se confinam apenas às associações de cariz ambientalista, passam até pelas próprias autarquias e até por uma parte significativa da comunidade científica.

E aqui reside a vertente porventura decisiva. Acontece que os estudos que existem não são de forma alguma favoráveis à exploração, nem à produção. 

Para rematar uma situação pouco, ou nada, transparente, a posição mercantilista do Governo da República, que tem feito o que pode para, uma vez mais, vender o território à especulação financeira, com uma definição pouco rigorosa do problema e com declarações pouco abonatórias de quem as profere. O modelo extractivista domina a cena em Portugal, de uma forma acrítica e desrespeitadora até dos pareceres ambientais. Tudo parece valer na tentativa espúria de esburacar o País. Repare-se, por exemplo, que o citado Relatório do Lítio, vem propor um designado cluster de empresas, universidades e laboratórios do Estado, com financiamento público e comunitário, para promover um consórcio entre empresas que pretendam valorizar os seus minerais até a fase metalúrgica. A intervenção, sempre facilitadora do Estado, quando se trata de proteger os interesses privados e sem querer assumir, por exemplo, uma participação directa na prospecção e na exploração, abre as portas às intervenções e arbitrariedades possíveis das grandes companhias mineiras. Este Relatório vai ao cúmulo de admitir (pág. 70) como “ameaça” (na definição SWOT)[i] uma “Contestação social desajustada e desinformada que provoque decisões políticas incoerentes e injustas.”

Convém, entretanto, referir que as reservas portuguesas são insignificantes e não justificam, por si, a exploração por ser manifestamente muito pouco viável. Um dos exemplos porventura mais significativos desse irrelevância é dado pela empresa britânica Savannah Resources (que detém 100% do Projeto Lítio do Barroso, desde Junho 2019) que se propunha produzir 0,175 milhões de toneladas de concentrado de lítio por ano na mina de Covas do Barroso, que possui cerca de 20 milhões de toneladas de lítio. Convém também dizer que aquela empresa não possui qualquer histórico de actividade, nem conhecimento significativo, que na mineração, quer na produção de lítio, o que não a impede de propor também a construção de uma refinaria de lítio em Portugal. A propósito, na Europa apenas existe um projecto para uma refinaria de lítio, localizada na Alemanha.

Para além da pouca relevância das reservas, há que considerar ainda as dificuldades impostas pela baixa concentração do minério e a forma de extracção muito dispendiosa.

 

Conclusão

De uma forma geral, os especialistas consideram importante a percepção social entre o equilíbrio ambiente e economia e a execução de políticas e a capacidade de investimentos.

Existe uma enorme opacidade no processo das concessões de licença. Mas, entretanto, lá se vai sabendo, aqui e ali, pormenores “interessantes”. Por exemplo, uma notícia de Julho de 2017, do Jornal de Negócios, dá conta de um contencioso entre a empresa australiana Novo Lítio e a portuguesa Lusorecursos, por força da prospecção em Montalegre. Aconteceu que a licença foi atribuída à segunda e a primeira accionou um processo, por se sentir lesada, na medida em que a licença lhe terá sido atribuída. Em causa estaria um investimento de 370 milhões de euros, para a construção de uma mina e de instalações de processamento do mineral.

Entretanto as populações vão ficando cada vez mais à margem destes processos, quando deveria ser exactamente o contrário, ou seja, qualquer índice de desenvolvimento se deveria pautar pelo respeito pelos cidadãos residentes e pela consideração do seu envolvimento e participação. Já agora, a empresa australiana Dakota Minerals originária da Novo Lítio anunciaria, precisamente um ano antes, ter chegado a acordo vinculativo para comprar à Lusorecursos 100% dos direitos de prospecção de lítio em três áreas do nosso País, Serra de Arga, Barroso-Alvão e Almendra-Barca d'Alva.

A verdade é que as consequências desta “fúria extractivista” são, entre outros, a destruição irreversível da paisagem e do património arquitectónico das regiões afectadas, a limitação do acesso à água potável, a dificuldade do acesso a solos aráveis não contaminados, o perigo para a saúde das populações, o impedimento do acesso a propriedades confinantes com as explorações, a mudança das dinâmicas sociais da comunidade e as mais que prováveis desvalorizações no imobiliário e no turismo das regiões.

O disparate e o absurdo chegariam, entretanto, no final de 2021, pela voz do Ministro Matos Fernandes, ao anunciar a refinaria de lítio que a Galp e a sueca Northvolt querem desenvolver em Portugal, com um investimento de 700 milhões e com fundos públicos. São dele (ministro) as seguintes eloquentes palavras "A Galp não é uma empresa qualquer para Portugal, e a Northvolt não será uma empresa qualquer para Portugal".

A verdadeira motivação de todo este negócio estranho, pode porventura residir na enorme “chuva de dinheiro”, proveniente dos fundos comunitários...

 


[i] Análise SWOT (do inglês: “Strengths”, “Weaknesses”, “Opportunities” e “Threats”) é um modelo de planeamento estratégico que permite a uma organização identificar as suas forças, fraquezas, oportunidades e ameaças 

 


14 fevereiro 2022


 


10 fevereiro 2022

COMO FAZER MELHOR (após o 30 de Janeiro)?

3 Fevereiro 2022

Alfredo Soares-Ferreira (*)

 

A 13 de Janeiro apresentamos aqui um “Brevíssimo Manual De Pedagogia Eleitoral”, onde procuramos fazer uma abordagem, simples e prática, do Acto Eleitoral. Hoje ensaiamos, tentando ver mais além da interpretação factual dos resultados, uma pequena “viagem” pelo universo, sempre complexo, da política. Qualquer simplificação que possa eventualmente ser encontrada no que pode ser considerado um “Guia” e possa ter algum significado para quem nos lê, será motivo de reconhecimento para quem escreve, uma vez que apostamos também na viagem.  

 

 

Escolha do destino

Pensamos que Portugal é um bom destino. Sem prejuízo de qualquer outro. É esse aliás o pensamento de larga maioria de pessoas que visitam o País, embora por vezes de uma forma invasiva, vão destruindo a paisagem, por falta de planeamento adequado, e invadindo as nossas cidades, a quem a especulação imobiliária oferece aquilo que tem e mesmo o que não tem. Sendo esse, no entanto, assunto para outra conversa, convém dizer que, cada português que aposta no conhecimento do seu País é, sem sombra de dúvida, um trunfo de peso para a comunidade.

 

Roteiro

Impõe-se uma escolha criteriosa. Porque afinal nunca se pode ver tudo de uma vez. Todavia, quando se viaja, procura-se sempre ver o máximo possível, já que investimos muito na passagem. Mas atenção, os roteiros que nos apresentam e que nos entram casa dentro, todos os dias, nos programas da manhã das TV, não serão decerto a melhor escolha, uma vez que afunilam as preferências, mostram quase sempre o mesmo roteiro da intriga e da maledicência e, também quase sempre, os guias são de baixa qualidade e perfil. Há então que ser mais exigente, ou seja, procurar que nos deem a conhecer todas as hipóteses, que nos permitam uma escolha decente.,

 

Documentação necessária

Será suficiente o Cartão de Cidadão. É hoje o nosso passaporte para muitos destinos, devemos cuidar da sua manutenção. Se ele tem hoje esta designação não será por acaso. Significa então que é, ou deveria ser, um cartão de Cidadania. Deveríamos ter orgulho em ser cidadãos, em todos os momentos da vida e não só quando o temos que o exibir, na altura do voto, que afinal não é assim tão frequente. Um amigo contou um dia que levou a filha à Loja de Cidadão, para obter o CC, assumindo esse acto com toda a dignidade possível, procurando transmitir-lhe a ideia de uma certa solenidade, uma vez que era a primeira vez que ia ser “promovida” à categoria suprema de cidadã.

Ser cidadão deveria então ter um significado particular, em termos de qualidade. Entende-se assim que tal implique exigência em relação à Democracia, numa elevada participação na vida do País e das suas decisões. 

 

Deslocação e passagens 

O Poeta diz que “A ponte é uma passagem p´rá outra margem”. É usual reconhecer-se que é importante a construção de pontes, em matéria política. Na política poderemos associar a “outra margem” a cada um de nós. E a ponte, a estrada que deve existir entre o cidadão e os seus representantes, no caso das democracias, os deputados.

Provavelmente acontecerá que uma parte muito significativa de quem quer “viajar” não vai ter dinheiro para “comprar a passagem”. Esses irão certamente ficar reféns de quem lhes conte como foi, os relatos, as impressões, algumas fotos. Não será seguramente a mesma coisa, que isto de viajar é mesmo um privilégio. E a vida do cidadão comum, que está muito longe da vida de quem usufruiu dos privilégios e ainda por cima o explora, vai-se “deslocando” para um estado de incapacidade crescente para adquirir a tal “passagem” para um estatuto melhor.

 

Estadia

Quem está na política, com o objectivo de prestar um serviço público, e não para sistematicamente dar espectáculos de vozearia e propaganda, tem programas e medidas para o País e interpreta à sua maneira os problemas dos cidadãos, bem como as possíveis soluções, consoante está à Esquerda ou à Direita do espectro político. Por isso é que o chamado “interesse nacional” não existe, se não for referenciado a quem o interpreta. 

Se bem repararmos, os cidadãos não são convidados a discutir política. Se porventura o fossem iriam descobrir muita coisa. Se, por exemplo, os cidadãos percebessem que a integração europeia lhes retirou os direitos de base e que, neste contexto, quando são avançadas algumas propostas para melhorar a sua situação, acabam por esbarrar na parede de aço que é a EU. Se, outro exemplo, os cidadãos conseguissem entender que é a própria estrutura monetária (a moeda única, o euro) a principal responsável pela estagnação do País, decerto gostariam, no mínimo, de analisar e poder discutir alternativas. Se finalmente, os cidadãos pensassem que, quando lhes falam na necessidade de “reformas estruturais”, isso significa, no limite, a perda de direitos no trabalho e um impedimento a qualquer política de pleno emprego, decerto que não aceitariam. 

Quando descobrirem que há impedimentos permanentes e razões estruturais que justificam que tudo fique na mesma, mesmo quando muda alguma coisa, os cidadãos irão decerto reagir, independentemente do tempo que seja necessário para tal. Aqui talvez possa ser útil o argumento de Antígona, que diz respeito ao cruzamento de dois imperativos, que reportam a dois tipos de necessidade, o de obedecer à lei e o de respeitar os costumes. Diga-se que, na obra de Sófocles, Antígona optou claramente por desobedecer ao rei.

Na verdade, o cidadão comum preocupa-se com o imediato. É a sua habitação, que no inverno não consegue aquecer porque o preço das energias está pela hora da morte. É o seu emprego, que é precário e onde é sistematicamente mal pago, isto quando o tem. É a sua reforma que vai, de ano a ano, sem ser aumentada, perdendo valor, num período da vida onde tem que fazer mais despesa, em medicamentos, em lares, na sua alimentação.

Assim, a “estadia” do cidadão na política, acaba por ser pouco agradável. É em parte devido a isso que o cidadão vai ficando zangado e permeável a propostas populistas ou completamente impossíveis de realizar, como as que lhes são “oferecidas”, nomeadamente, pelos partidos que entraram, agora em toda a força, na Assembleia da República.

 

Seguro de viagem

A política não é um jogo, antes a viagem ao mundo fantástico das ideias e utopias. Para qualquer viagem é necessário um seguro. No caso da política, ele pode passar pela garantia, quer do cumprimento do mandato, quer do programa e medidas que contém. 

Para que tal seja viável, torne-se necessário que cada cidadão assuma a decisão de se “ocupar” da política, afinal uma cláusula única do seguro. Até porque, se o cidadão o não fizer, acabou de tomar uma decisão política decisiva, ou seja, acomodou-se ao poder dominante.

Poderíamos adicionar algumas outras cláusulas. Optamos por esta, que será porventura determinante, a da soberania. De facto, a Constituição da República Portuguesa consagra, no Artigo 1.º, que “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.” e, no Artigo 2.º, que “A República Portuguesa é um Estado de direito democrático, baseado na soberania popular, no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efectivação dos direitos e liberdades fundamentais e na separação e interdependência de poderes, visando a realização da democracia económica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa.” e, no Artigo 3.º”, que, “A soberania, una e indivisível, reside no povo, que a exerce segundo as formas previstas na Constituição...”

E, bem a propósito, uma vez que todos os dias vemos gente a passar fome, podemos escolher um tipo de soberania muito importante para os cidadãos, a soberania alimentar. Que significa basicamente, o direito a decidir das políticas agrícolas e alimentaresou seja, decidir o que cultivar, o que e como comercializar, o que destinar ao mercado interno e ao mercado externo, e controlar os recursos naturais básicos.

A soberania alimentar privilegia o direito efectivo a uma alimentação saudável e respeitadora do ambiente para todas as pessoas, colocando em primeiro lugar quem cultiva os produtos com os quais a comida é confeccionada. Como é evidente, para que tal seja possível, é necessário manter o controlo sobre os recursos naturais, em particular a terra, a água e as sementes, que são bens públicos e não devem, por isso, ser privatizados.

 

Então,

Uma possível resposta à questão “Como Fazer Melhor?”: é mesmo importante (e urgente) visitar e conhecer o País, para melhor o compreender. 

E, em função disso, actuar em conformidade.

 

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(*) Engenheiro e Professor aposentado. Consultor e Perito-Avaliador de Projectos nacionais e internacionais para o Desenvolvimento e Cooperação


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