20 novembro 2005

SER PROFESSOR…
 

«Con el alma en una nube y el cuerpo como un lamento,
viene el problema del pueblo, viene el maestro.
El cura cree que es ateo, y el alcalde, comunista;
y el cabo jefe del puesto piensa que es un anarquista
...»
Patxi Andion
«Venho também em homenagem à solidariedade e à generosidade do ofício de professor, do acto de ensinar, como sempre refiro quando apresento a canção do maestro»
Patxi Andion, Coliseu do Porto, 2000

Está pelos vistos na moda, a avaliar pelo que se lê, ouve e vê na comunicação social, dizer mal de tudo o que é função e administração pública e, em particular, dos professores. Aliás, tenho notado que vários artigos de conhecidas figuras públicas escrevem sem qualquer pudor e, ao que parece, sem qualquer conhecimento concreto da situação, sobre o ensino e a formação, emitindo posições mais que controversas sobre a matéria. Chega-se até ao ponto, ridículo na minha opinião, de dar a entender que os profissionais daquelas áreas não querem trabalhar, ou querem trabalhar menos, ou coisas do género. Não são posições sérias, nem dignificam quem as toma.

O título de 1ª página de 18 de Novembro no DN Professores faltaram a 7,5 milhões de aulas é porventura um bom furo jornalístico, sobretudo em dia de greve; a falácia instalada na comunicação social (sobretudo na escrita) é de tal ordem escandalosa que, por exemplo neste caso, peca sobretudo pela omissão de dizer que o exemplo nem sequer abrange uns míseros 10%! Nesse mesmo dia no Publico (e mais uma vez) Miguel Sousa Tavares (MST) vem à liça informar a opinião pública que os professores passam em media 14 horas nas escolas e 21 em casa ou na rua a preparem as aulas (o destacado é dele); realmente é preciso não ter um conhecimento mínimo das coisas para fazer afirmações como esta. Neste ultimo caso, não é a primeira vez que MST produz tal discurso; devo dizer que aprecio a prosa do autor e que todas as sextas leio atentamente as suas crónicas; ficaria bem a MST informar-se melhor sobre o assunto e (naturalmente) retratar-se publicamente das incorrecções que tem cometido sobre os professores; no mínimo! Neste mesmo dia, também no Publico, a Ministra da Educação publica um artigo sob o título O desafio da educação, em que disserta sobre o tema em geral da qualidade e dos resultados da dita; os lugares comuns que utiliza são tão comuns que apetece perguntar onde é que Maria Rodrigues estava quando tanta gente neste País já há tanto tempo dizia exactamente a mesma coisa: esforço financeiro demasiado para tão poucos resultados, milhares de jovens abandonam a escola sem a escolaridade obrigatória, as taxas de insucesso se situam em níveis muito elevados...; é caso para perguntar, o que é que ela faz (ou fez, ou fará...) para inverter a situação; o mesmo se aplica e ainda com mais força a afirmações no mesmo artigo - da necessidade de reorganização da rede escolar, melhoria das instalações, valorização das competências científicas dos professores; mas afinal quem é que deve fazer isto, senhora ministra?


Contudo a situação poderia ser diferente. Se pensarmos um pouco, chegaremos rapidamente à conclusão que um profissional, em termos académicos é uma pessoa minimamente responsável e, como tal, em principio tentarádar o seu melhor, no seu posto trabalho, na sua escola, na sua instituição. É preparado para isso e, também em princípio, irá desenvolver normalmente a sua actividade profissional, se lhe forem dadas condições concretas para o fazer. Isso não quer dizer que não haja professores irresponsáveis, ou incompetentes, ou outras coisas; e depois, não será o mesmo em outras profissões? Promova-se uma avaliação séria do desempenho: não são os professores e as suas organizações sindicais as primeiras a propor tais medidas?

O professor, qualquer professor é o responsável pelos seus alunos, pelos nossos filhos, pela formação daqueles a quem mais queremos. É ele que abre as portas da nossa mente, que nos ensina a ler, que dá luz ao escuro que vai dentro de nós, como diz o poema. Aquele que, muitas vezes com sacrifício acrescido, é obrigado a trabalhar 4 ou 5 horas seguidas, com intervalos de 5 ou 10 minutos, sem abrandar o ritmo; que se o fizer, perde o contacto com o grupo que tem pela frente e perde a atenção dos que esperam dele uma palavra, uma opinião, um naco de saber. Aquele que em muitas circunstâncias é agredido com a violência natural de gerações problemáticas, dos chamados miúdos difíceis, para os quais existe sempre uma atenuante de comportamento socialmente justificável pelas difíceis condições que vive em casa, no bairro, etc...

As autoridades, o ministério da Educação, os responsáveis deviam saber tudo isto. Melhor, sabem tudo isto, conhecem bem os enquadramentos e os meandros da situação. Só que, a forma mais simples de esconder a sua natural incapacidade para dar a volta, é atacar quem trabalha, quem se esforça, quem dia a dia trava uma luta contra a ignorância e o obscurantismo, numa trama de contradições que éa realidade desta vida. E nem se dão conta porventura da injustiça que representa esse discurso fácil para quem, por exemplo, passou anos a fio sem dar uma única falta, para quem gasta horas fio a preparar sistematicamente os seus materiais pedagógicos para ilustrar as suas aulas e as suas dissertações (atenção MST, é que isto tem mesmo de se fazer!), para quem sistematicamente se procura actualizar cientifica e pedagogicamente, frequentando cursos de formação, escrevendo artigos, publicando teses, enfim para quem se esforça no sentido de poder ter uma intervenção cívica na educação e na formação dos jovens deste País. Esses, que são seguramente muitos milhares, incógnitos e injustiçados.

O desafio da educação passa a meu ver na realidade pela valorização das competências e pelo reconhecimento do que tem sido feito até agora, mau-grado os sucessivos avanços e recuos a nível dos responsáveis pelo ME desde há20 e tal anos e sempre com a responsabilidade dos 2 partidos do bloco central, sem que se tenha feito uma avaliação séria das mudanças efectuadas. Essa é a verdade dos factos. O desafio da educação passará eventualmente pela positiva e não o contrário.
E passará sempre, sem qualquer dúvida pelos professores e nunca contra eles!

06 novembro 2005

A propósito de Theodorakis (e não só...) 


Dancemos pois como Zorba, ao ritmo da alegria de viver e da liberdade. Dancemos ao saber que Mikis Theodorakis foi galardoado com o Prémio de Música da UNESCO-Conselho Internacional da Música, uma distinção internacional ímpar no campo da música. Mikis é Zorba para sempre e este prémio, tal como sua música - a sua vida - é uma luta pela liberdade e pelos direitos humanos, uma luta contra a opressão e as ditaduras militares, pela Paz, na sua Grécia e em todo o Mundo. Sim, porque Mikis é um cidadão do Mundo, um homem que ama a vida e que diz que só poderia ter ser músico.

Mikis junta-se à soberba galeria de gregos galardoados como Kaváfis, Seferis, Ritsos e contribuiu para a eternização do romance de Kazantakis (também autor de A última tentação de Cristo). O nome de Mikis estará sempre ainda ligado a Irene Papas e a Melina Mercoury de uma Grécia pobre e austera a preto e branco, mas que todos - elas e eles - encheram de cor, com a sua arte, a sua presença e a sua luta.

Todos teremos dentro de nós um pouco de Zorba e dançamos ao ritmo da nossa própria força. Tal como Zorba, a dança é uma arte mental e não física; lembramo-nos das suas palavras, "dançamos com a cabeça e um sorriso no rosto, os braços são apenas para dar o equilíbrio" e recordamos o autêntico hino á vida a a que Mikis deu a sua música.

Um dia depois, Alegre poderia ter citado Mikis quando fez o seu discurso e afirmou que a participação dos cidadãos na vida política não se esgota na representação partidária. Certamente poderia propor uma outra dança na pobre arena da politiquice à portuguesa e, homem da cultura que é, poderia saudar este prémio de Mikis (que Cesária e Maria João já receberam também) para talvez dizer que podemos aspirar a algo diferente do que nos é dado diariamente pela loucura da comunicação social que propõe a "inevitabilidade Cavaco".

Há cada vez mais gente que quer essa outra dança; para isso é urgente que aqueles que já acordaram e que (ainda) têm memória, consigam pelo menos trocar o passo á mediocridade e virar o disco que recorde o Zorba e que toque o ritmo da insatisfação e da rebeldia, cada vez mais forte. É afinal, pela liberdade e pela alegia de viver!

01 novembro 2005

UMA ACTIVIDADE PARASITÁRIA .. 

Quem acompanha minimamente a informação que nos vai sendo dada pela comunicação social, escrita e/ou falada, pôde constatar uma série de notícias sobre a Banca portuguesa, na semana passada. De facto, quer o Publico, quer o J.N. fizeram algum destaque às buscas nalgumas entidades bancárias, a propósito (?) de suspeitas levantadas pela PJ sobre actividades paralelas dos bancos nas off-shores (leia-se, na da Madeira...), ligadas á lavagem de dinheiro e, ao que parece, ao branqueamento de capitais. As buscas às sedes do BCP, do BES e posteriormente do BPN confirmam as suspeitas e estendem-se a interesses dos vários bancos, tais como empreendimentos, herdades, casas de férias, etc....

Tudo coisas que a gente sabe de há muito tempo a esta parte. Digo eu, claro. E como a gente sabe, sabem também as autoridades. Portanto, é de saudar, apesar de tardia, a iniciativa da PJ.

Tenho para mim, que a actuação da banca, de uma forma geral, é no nosso País, um dos exemplos acabados de má politica e de má gestão. Os bancos pagam impostos em Portugal qualquer coisa como a 3ªparte de qualquer contribuinte, individual ou empresa. E para quê, para cumprir alguma função social? Para apoiar empresas a desenvolver a sua actividade? Para apoiar a internacionalização da empresas nacionais? Para apoiar os cidadãos na melhoria das suas condições? Nada disso, como se sabe. Apenas e só, cada vez mais, uma actividade especulativa a coberto das isenções e dos favorecimentos de nós todos, afinal. E de ano para ano, os bancos aumentam os seus lucros, em completo contra-ciclo com as outras actividades económicas e, pelos vistos, ainda ocultam e transferem para off-shoresparte dos lucros que geram.

Penso que muita gente tem más experiências com os bancos e com os seguros, outra das actividades que geram cada vez mais lucros e para os quais os contribuintes mais contribuem; enfim, um roubo legalizado, instituído e ainda por cima, nalguns casos, obrigatório. A minha última experiência, por exemplo, foi a detecção de um débito na conta-corrente de qualquer coisa como 200 e tal euro que eu não sabia explicar; após ter consultado o gestor de conta do banco, foi-me informado ter havido um lapso e que oportunamente me seria creditado na conta um valor idêntico; caso para perguntar, o que aconteceria se eu não tivesse dado conta do erro...

A ideia que a maioria das pessoas fazem dos bancos é pior que o que possa parecer à primeira vista; faça-se um inquérito (como está agora em moda, por assuntos menos importantes...) e vejam-se os resultados. No ano passado, estive presente em 3 sessões públicas para apoio a projectos de empreendedorismo de mulheres. Projectos que visavam o apoio publico a iniciativas empresariais de jovens mulheres, com habilitações ao nível da licenciatura (na sua maioria). Para as sessões foram sempre convidados os bancos, fonte natural de financiamento de actividades empresariais. Pois acreditem que em nenhuma das sessões, compareceu nenhum dos bancos convidados; o contrário, por exemplo, de entidades cooperativas ligadas ao micro-crédito. Numa das sessões, uma convidada francesa, ligada a uma associação de apoio ás novas empresas, declarou existir em França um acordo entre a banca e o governo, que incluía a possibilidade de acesso a um crédito especial durante os 3 primeiros anos de vida da empresa. Porque é que tal não existe no nosso País?
A resposta a esta questão é muito simples. Porque os bancos não contribuem para o desenvolvimento do País, não precisam de arriscar um mínimo que seja numa actividade empresarial, dadas as benesses que já têm e que cada vez geram mais e muito mais lucros. Esta actividade sim é rentável. Tão rentável que até se compram uns aos outros, numa frenética diversão, típica do 3º Mundo...

Pensemos finalmente na panóplia associada à actividade de desvio de fundos: branqueamento de capitais, favorecimento de negócios menos claros entre estados e privados (leia-se máfias...), tráfico de droga, tráfico de armas e outros que a gente nem conhece bem, Tudo isto existe de facto e funciona num Mundo que parece diferente daquele em que nos movemos...

Pois que se tenha coragem de ir até ao fundo na descoberta das irregularidades ora avançadas, mas não só. Que se tenha coragem também de acabar de vez com o off-shore da Madeira. Que se acabe de vez com o famigerado sigilo bancário. E que os bancos passem a desempenhar um papel social de apoio às empresas e aos cidadãos, em vez de apoiarem actividades ilícitas e impróprias, alimentando as grandes fortunas e favorecendo o desvio de capitais e do dinheiro que, pelos vistos, tanta falta faz ao País.

# publicado por Alf : 18:13

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