06 fevereiro 2013


O Sal da Ilha

“… Deu-me conta dessas ilhas
arquipélagos ao luar
com os areais estendidos
contra a cegueira do mar
Esperando veleiros perdidos…”
 A Ilha”, Carlos Tê e Rui Veloso



 


Passeio na Ilha por 18 €. Saímos 9 e meia da manhã, com atraso não significativo, no stress, recolha à porta, passagem pelos hotéis de nome, meliás, barracudas, morabezas e quejandos, quase exclusivamente destinados aos turistas de topo, ingleses, alemães, holandeses e franceses; de topo é uma maneira de dizer, pois como mais adiante se verá, o “topo” é apenas uma forma de medida de ter mais dinheiro. 
As passagens sucessivamente escalonadas pelo Olá, o nosso guia de serviço, incluíam Murdeira, Aeroporto Amílcar Cabral, Palmeira, Buracona, Terra-Boa, Espargos, Salinas (Pedra do Lume). Espargos é a capital da ilha, a Esplanada Bom Dia é o ponto de encontro obrigatório, para quem chega e para quem parte, fica a uns 5 km do Aeroporto, daqui a Santa Maria são 12 km, a ilha é pequena. Infelizmente, mas sem surpresa, a Hiace enche-se de turistas dos ditos hotéis e, quando Olá aponta para a esquerda, dizendo que tem uma primary school, de imediato surge a pergunta de uma parola alemã, querendo saber se era a única da ilha… E aqui é de assinalar os comentários racistas das outras e dos outros passageiros, tanta ignorância, tanta estupidez, que mete dó. Esta gente ignora, por exemplo, o fortíssimo investimento feito na educação, pelo Estado cabo-verdiano, nos últimos anos e, que se traduz na escolarização de toda a população. Pobres diabos, que Deus, se existe, lhes perdoe, que eu por acaso, não. 
Buracona, assim mesmo, uma maravilha de paisagem, após uma travessia, que merecia ser feita num todo-o-terreno, que por sinal se faz, mas por um preço fora do nosso bolso de português roubado a toda a hora. As crateras de um solo vulcânico podem ver-se um pouco por todo o lado e há mesmo uma que alguns mais afoitos se debruçam, mesmo ao pé do enorme fosso, aqui não vou, só de longe, com muito respeito.
E, na volta, a surpresa, no meio do deserto, a Terra Boa, onde se pára, para de cócoras se apreciar a miragem: num tufo mais além, a água é uma miragem, onde somente a areia marca terreno.

Salinas. Minas de sal, que dá nome a ilha, era no tempo colonial uma fonte de receita, ainda se podem ver no local, os postes de madeira que suportavam uma espécie de teleférico para transporte do material. As minas de sal datam de 1778, por iniciativa do português Manuel António Martins, ao tempo um empreendedor, promove a exploração das minas, abre túnel, recorrendo aos “seus escravos”. No início do século passado (1920) a companhia francesa Salan du Cape Vert implanta a estrutura de um teleférico (resíduos na foto). Nos anos 90, a companhia italiana Sphanina, compra a concessão e explora a seu belo prazer a entrada na mina, para que as pessoas possam nadar na boca do extinto vulcão e, apreciar a forma como, sem nada fazer, o corpo flutuar, dada a fortíssima concentração de sal; a entrada custa 5 €, e para quem quiser, mais 1€ para tomar um chuveiro rápido, para tirar o sal do corpo. Procuro encontrar uma explicação para tão insólito caso, o guia não hesita em avançar uma explicação pouco ortodoxa, que aponta para a corrupção entre o privado e o público, com nomes e tudo, no que parece mais uma cópia grosseira dos maus hábitos europeus, nomeadamente portugueses.
Enfim, Lá longe / Inventei o dia azul /E o desejo de partir /Pelo prazer de chegar /Ao Sul(a)

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(a)       Extracto de “Ao Sul”,  João Monge e João Gil, 1998

04 fevereiro 2013

O Sal da Terra Cabo-Verde

 
 
 
 
 
 
 
 
Uma ilha que marca o Atlântico. Chego bem cedo ao Aeroporto Internacional Amílcar Cabral, a tempo de tomar o pequeno-almoço em Espargos. Passo, após uma pequena paragem, ao transporte para Santa Maria, viagem rápida no transporte colectivo, nada de táxi, falámos com as pessoas, sempre simpáticas e acolhedoras. Fica o registo para o condutor, que insiste em me deixar a porta do Hotel. Tranquilo, no stress, o lema que parece ser da ilha, está escrito por todo o lado, as pessoas terminam uma frase desta forma, fantástico.
Uma volta de reconhecimento pela cidade, depressa se torna um encanto a vista, as cores da água, as cores do peixe, as cores das pessoas, os pescadores, os mirones. A praia, um descanso, o sol, a água, o som da música sempre. A noite, o jantar num tasco, os bares, agora a música mais forte, o grogue, enfim agora o outro descanso de um dia cheio. Havia ainda de contar o jogo com o Gana, uma pena, os Tubarões mereciam muito mais, o árbitro a roubar do princípio ao fim, e no final, a festa, sim a festa, pois aqui há sempre festa, porque merece ver a forma como as gentes se manifestam, com aquelas danças que mexem connosco, uma autêntica maravilha.
Uma Terra de sal, um sal da Terra, que entra pela gente. Aqui fuma-se muito, E a gente vai fumando que, também, sem um cigarro / Ninguém segura esse rojão… (a). Enfim, há que ir temperando as angústias, a paixão pela Vida. Esta é a verdade: a vida começa quando a gente compreende que ela não dura muito… (b)
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(a)    Extracto de “Meu Caro Amigo”, Chico Buarque / Francis Hime
(b)   Pensamento de Millôr Fernandes, escritor, cartoonista e humorista brasileiro (1924/2012)

 

 


Praia, cidade irmã

 
 
 
 
 
 


Lua, vagabunda de espaço. Imagem das ilhas plantadas no Atlântico, de sol quente e acolhedor. Praia, nome de cidade que acolhe como ninguém, os amigos que nos recebem, os irmãos, os novos que fazemos e com quem partilhamos conhecimento, angústias, alguns sonhos.
Andamos ruas e avenidas, o sol, as noites, o Fogo d´Africa, os sons das mornas e coladeras, um encantamento contínuo que só Cabo Verde é capaz de transmitir. Mas, tudo tem si prezu (a), os filhos de África sofrem e pagam também a ganâncias dos donos de um mundo desumanizado. Domingo, 27 Janeiro, a cidade exulta com a vitória sofrida dos Tubarões Azuis sobre os Palankas Negras, todo mundo na rua, canta-se, dança-se, grita-se, e claro, bebe-se e come-se, por esta ordem. Sim, porque do mundo nada se leva, mas é formidável ter uma porção de coisas a que dizer adeus (b).

Meu caro amigo eu quis até telefonar / Mas a tarifa não tem graça (c), só não estou aflito p´ra fazer você ficar / A par de tudo que se passa (c), vai no Facebook, que é de borla, está lá tudo, ou quase…
Aqui percorremos alguns trilhos de solidariedade, a sociedade civil está bem consciente do seu papel e mobiliza-se pelas mesmas causas e mais por aquelas que emanam de um país (ainda) em desenvolvimento. Apesar de todas as dificuldades, a confiança reside nas pessoas e exprime-se na divisa: Nu cré! (d). 

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(a)       Em português: tudo tem o seu preço

(b)      Pensamento de Millôr Fernandes, escritor, cartoonista e humorista brasileiro (1924/2012)

(c)       Extractos de “Meu Caro Amigo”, Chico Buarque / Francis Hime

(d)      Em português: nós acreditamos!

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