31 outubro 2020

 Subscrevo o texto do Domingos Lopes, publicado no Jornal Público de 28 de Outubro 2020 

https://www.publico.pt/2020/10/28/politica/opiniao/orfandade-ps-presidenciais-importancia-segundo-1937077



E é precisamente pelas razões que ele invoca que decidi, há algum tempo, não ter participação activa nas Presidenciais.

Não deixa de ser irónico que alguns dos que vociferaram em tempos contra MRS, sejam agora seus apoiantes, mais ou menos assumidos.

Não deixa de ser devastador para a Esquerda, apresentar a mesma fórmula de sempre, na figura de candidatos mais ou menos partidários, "lutando" por um pódio que só existe no estrito quadro burocrático das estruturas partidárias.

 

Quando (ingenuamente) se pensava na junção de forças à Esquerda, para não legitimar a entronização anunciada, eis que ela começa a desenhar-se num horizonte turvo de névoa, ainda por cima com a previsibilidade da adesão fácil a uma candidatura sem qualquer valor e que parece ganhar forma, assustadora e populisticamente anti-democrática.

 

Recordo alguns termos de uma proposta que subscrevi, em Julho passado, na qual se defendia “...uma candidatura presidencial que ajude a romper com paradigmas baseados no pressuposto de um crescimento infinito impossível de compatibilizar com o respeito pela Natureza, e impulsione a reflexão que se há-de traduzir num novo paradigma civilizacional, uma candidatura de mudança que proporcione a eleição de um novo presidente para um Portugal que saiba construir hoje um país com futuro.”

Nesse Manifesto, afirmava-se o Estado Social, como uma “...das mais valiosas realizações das últimas décadas, providenciando uma rede alargada de serviços públicos em áreas como a Saúde, em que o Serviço Nacional de Saúde durante a pandemia mostrou ser insubstituível, mas necessitar de reforço estrutural, ou a Segurança Social – ambos alvo de apetites privados que tendem a desvirtuar a sua abrangência. É indispensável reafirmar a primazia do caracter público e universal de uma rede de protecção que não distinga os portugueses em função do seu nível de rendimentos e assegure uma real igualdade de acesso a esses bens e serviços

E ainda, assumindo o combate às desigualdades, como sendo “...o eixo central de uma plataforma eleitoral alternativa atenta aos valores de Abril” e capaz de lutar pela inversão do modelo de desenvolvimento actual, como base em princípios de uma política que “...coloque as pessoas em primeiro lugar, e olhe para a educação, a cultura, a ciência e a tecnologia de forma a oferecer as bases para uma economia mais sustentável e sadia.”

E que finalmente, constituísse um travão à burocracia de Bruxelas, baseada em leis, critérios e tratados, que determinam um modelo de desenvolvimento único e manifestamente neoliberal, impondo “...a defesa da soberania nacional e um modelo de desenvolvimento adequado às necessidades e permita ao país definir as suas próprias opções estratégicas.”

 

Hoje, quase no limite do manifestamente possível, assistimos passivamente às previsões adequadas à continuação do status, como que conformados pela marcha inexorável destes tempos em que a crise pandémica acentuou a perda da soberania democrática, para juntar à perda da soberania política e económica e em que o País parece flutuar numa ideologia feita de senso comum e submetida ao poder mediático de meia dúzia de comentadores encartados que determinam o chamado “interesse nacional”, onde predomina um instinto austeritário e conservador.

 

Mas, claro que votamos. 

E naturalmente votaremos. Na devida altura, falaremos disso. 


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Nota: os enunciados são retirados do Manifesto “UMA NOVA PRESIDÊNCIA PARA PORTUGAL”, apresentado pela Associação Política “PORTO COM NORTE – FÓRUM DE CIDADANIA”, que integra o Movimento de Intervenção Cívica da Região do Porto - MIC Porto, as Associações Renovação Comunista, Democracia Solidária e Fórum Manifesto. Porto, Julho 2020

 

 


27 outubro 2020

 O FALSO ARGUMENTO DO(s) PEC E PARTICULARMENTE DO “FAMOSO” PEC4

 

Nos últimos dias, o PS tem repetido vezes sem conta o mesmo argumento, para tentar a aprovação dos eu orçamento de austeridade.

Falo da proposta OE 2021, a ser apresentada na AR, para apreciação.

Perante uma fatalidade iminente, que resultaria do chumbo da sua proposta, o PS e todos os comentadores encartados que pululam nas rádios, TV e jornais, quase sem excepção (porque as excepções não têm lugar à mesa), se dedicam à nobre tarefa de convencer os cidadãos de 2 “verdades”, sendo a primeira a de que se trata de um bom orçamento, para o País, numa altura de crise. A segunda tem a ver com uma gasta e antiga concepção, que se rege pela comparação entre um eventual chumbo do OE2021 e o tão propalado chumbo do PEC4, do governo de Sócrates e Teixeira dos Santos, em Março de 2011.

 

O seu a seu dono

Na realidade, é um pouco estranho que o actual PS queira ressuscitar o falhanço de 2011, uma realidade quase a 10 anos de distância, num tempo em que o governo tinha uma maioria que jugava segura e que ignorava e hostilizava mesmo toda a Esquerda, protagonizando até episódios muito pouco edificantes, como o de Manuel Pinho. Um governo autocrático, dirigido por um homem pouco qualificado, capaz de tudo para se manter no poder, um poder que, entretanto, começava a dar mostras de quebrar o verniz, muito embora fizesse tudo o que Direita pretendia, não o fazia da forma como a Direita gostava. 

 

O que foi e o que constava do PEC4

Os PEC, mais propriamente os designados Planos de Estabilidade e Crescimento, não eram mais que a convocação de uma forma de exercer o poder, através de medidas de restrição orçamental, impostas pela burocracia europeia e que se podiam resumir em 3 objectivos fundamentais: a antecipação da austeridade, a permissão da "invasão" do País pela troika, mediante o controle orçamental e a aceitação da submissão a Bruxelas, consubstanciada na dívida permanente.

Particularmente, o PEC4 visava diminuir os pagamentos em pensões em 425 milhões, aumentar o IRS de reformados em 255 milhões, aumentar o IVA (passagem dos produtos alimentares para a taxa máxima, por exemplo), poupar 510 milhões em medicamentos, reduzir o gasto na escola pública em 340 milhões e cortar mais 400 milhões no investimento público. Se juntarmos a este panorama, o programa "especial" de privatizações, que passava afinal pela venda de empresas, como a TAP, a Ana, os CTT, os Seguros da CGD, a parte da Galp e EDP, a CP carga, a EMEF, os Estaleiros Navais de Viana do Castelo e, finalmente, as concessões dos transportes suburbanos, tínhamos uma imagem real da completa submissão do País a Bruxelas. Todo este "fabuloso" programa, repito, uma imposição da "união europeia", significava, mais impostos e cortes em pensões e no Estado Social. Curiosamente (para mim, de todo!), toda aquela receita viria a ser reproduzida pela troika e por Passos Coelho. 

 

E aqui existe um conceito

Claro que se pode argumentar tudo e o seu contrário, em nome do poder, essa sacrossanta instituição que permite a uns, arrecadar alguns privilégios e prebendas e a outros, manter uma forma superior de dominação, com base na perpetuação de medidas que ajudem a manter aquela mesma dominação. 

Se aqui reside um conceito político, que funciona com base em alguns legados do passado e que têm a ver com a luta de classes e a sua “ocultação”, disfarçada de metáforas como o “interesse nacional”, a “necessidade de reformas estruturais”, o “colocar o interesse nacional acima dos interesses partidários”, entre outros, o certo é que a coisa acaba por funcionar, através de um esquema de cedências à Direita, por parte dos partidos do centro, para cumprirem o mesmo programa de austeridade, de uma forma encoberta ou disfarçada, com algumas medidas sociais de pouca importância, mas com algum significado, pelo menos imediato. 

Isto é o centrão partidário, onde os partidos socialistas e sociais-democratas se encaixam, substituindo-se de quando em vez, para salvar aparências, mantendo no essencial a mesma política de partilha de lugares no aparelho de Estado, perpetuando desta forma a dominação. Não podem ceder em questões essenciais, como o rentismo, a liberalização do trabalho, a obediência cega às instituições europeias, enfim, ao domínio do capitalismo financeiro, que determina em última instância todas as decisões.

Tudo isto estava na génese dos PEC. O PEC4 era a cereja em cima do bolo, significava a rendição final em termos da submissão e da entrega da economia ao bel-prazer da finança e dos seus desmandos. Não resolvia o problema do País, era ele mesmo um problema para o País. A Direita, contudo não lho permitiria. Era a hora de tomar directamente o Poder.

E foi. Aquilo que queria, nomeadamente “fomentar a adaptabilidade interna à empresa, pela flexibilização das condições de mobilidade interna, de organização do tempo de trabalho e de negociação salarial. Adicionalmente, foram também flexibilizados diversos procedimentos, nomeadamente de despedimento colectivo. As mudanças introduzidas resultaram na maior redução da rigidez do mercado de trabalho verificada na OCDE” (pg. 25 do programa), entraria logo a seguir com a troika e com a “ocupação do País”, a que alguns chamaram “programa de assistência”.

 

Um argumento estafado e mentiroso

Provado que está o engano, venha a mentira sob a capa da intimidação e da ameaça. Na realidade, o Partido Socialista é incapaz de um arrojo de interpretação do funcionamento da economia e do próprio País, sem a tutela do rentismo, do clientelismo e da austeridade como princípios. Tudo gira em torno do que seria de rejeitar, para libertar o País da dominação e da submissão. 

As hesitações da Esquerda (aprovar ou abster-se de aprovar o OE2021) têm com a possibilidade de exercer pressão constante sobre os governos do PS. Com a possibilidade de conseguir pequenos ganhos para os trabalhadores, através de medidas de compensação de salários e pensões e com uma política de habitação condigna. Têm a ver ainda com a necessidade imperiosa de manter a Escola e, particularmente a Saúde, na esfera pública, em tempos de pandemia. 

Possivelmente também com agendas e calendários eleitorais, o que se pode até aceitar, para tentar introduzir, por exemplo, alguma dignidade nas presidenciais, de que o próprio PS ajuda a diminuir abstendo-se uma vez mais de participar e contribuindo dessa forma para o plebiscito a Marcelo.

Com a vinda a terreiro e a ressuscitação do PEC4, o PS presta mais um péssimo serviço a si mesmo, aos trabalhadores que diz defender e, em última instância ao País.

Qualquer que seja o resultado da votação na AR.


16 outubro 2020

 TANTO DISPARATE, AO MESMO TEMPO...

 

Atrapalhados pela covid e com o avanço das notícias de novos casos, tentamos dar conta de tudo o que aparece pela frente. Tentamos seleccionar, não conseguimos. A fúria imensa do desconhecido, mete medo.  Parece, volta a parecer, que é no medo e com o medo que temos de conviver.

Não há saída para tanto disparate?

Assim parece.

O anúncio de uma pretensa arbitrariedade do uso de uma aplicação informática para a detecção do vírus, faz renascer o disparate. Pelo menos, para não dizer pior. Já não há senso comum? Querem deter pessoas sem telemóvel, ou sem aplicação no dito, ou que saem de casa sem ele, quer dizer, sem o instrumento?

 

Ao mesmo tem, sim, tudo acontece (ou parece acontecer) ao mesmo tempo, Costa vem anunciar um designado “Plano de Resiliência”, com 6 mil milhões para as empresas. Mas para fazerem o quê? Bom, para construir, diz Costa. Que não é o Governo, diz ele, que vai construir, mas sim elas. E as pessoas? Esquece o Costa que ainda temos no País, mais de 2 milhões de pessoas que vivem abaixo do limiar de pobreza? Decerto que não, seguramente que não. 6 mil milhões?

 

Ao mesmo tempo, sempre ao mesmo tempo, vem um deputado do PS dizer hoje, nos jornais, “Estar contra este orçamento é estar contra o País”. Descubro então, assim de repente, que afinal sou um dos que estou contra o País. Estranha situação, para quem defende o País, mesmo que apenas no conceptual, assim o deve ser, assim o sinto que é. Mas não, eu estou contra o País, até coloquei (ainda que de forma virtual) algumas questões ao Ministro Leão, esse sim, que está a favor do País. 

Porque será que eu e o senhor Ministro estamos, um contra e o outro a favor do País?

Porque será que tem que ser assim?

Porque é que não é assim?

 

Ao mesmo tempo, ainda no mesmo tempo, o inefável Pacheco (de primeiro nome Duarte, do PSD) vem dizer que “...quando houve problemas, quem teve de os resolver fomos nós”, é caricato, porque a gente sabe como o PSD resolve problemas, mesmo sem recorrer a qualquer matemática especial, é cortar, sempre a direito, como o fizeram, na altura da invasão da troika, eram eles (e também elas) os bons alunos de Bruxelas. Sempre a cortar, sempre a ... “resolver problemas

 

O tempo, finalmente o meu tempo, o nosso tempo, sim porque ele (o tempo) também é nosso, sou eu a dizer, claro, mas acredito, mesmo sem ser crente, que é verdade. É meu e nosso também, quero mesmo repetir, quanto mais não seja, para afirmar posição e defender território. Dizia eu, queria mesmo dizer isto, é que me canso depressa com tanto disparate, com tanta asneira junta, acho que tenho (temos) o direito de exigir um pouco mais, seja ao mesmo, do azul que está mais acima, mesmo que seja de outra cor. 

 

Não quero dizer mais, quero só dizer isto...


11 outubro 2020

 DODESKADEN














Ontem, no Teatro do Campo Alegre, o filme “Dodeskaden”, de Akira Kusosawa, do ano 1971, precisamente um dos anos trágicos da vida do realizador japonês, quer do ponto de vista pessoal, quer mesmo profissional.


O que é certo é que este filme, dedicado aos pobres e desamparados, excluídos da sociedade, mostra, em diversos episódios “...da vida dos habitantes de um pequeno bairro de lata: bebedeiras, sonhos, depressões, casos de adultério, a luta pela vida de todos os dias. Um rapaz conduz um eléctrico imaginário, um outro, que procura comida nos caixotes de lixo dos restaurantes, sonha em encontrar o pai, uma rapariga faz flores artificiais para sustentar o avô alcoólico. O “chefe" informal do grupo é o velho Tamba, um velho artesão, capaz de tudo perceber e de tudo perdoar.” (cf. https://leopardofilmes.com/noticias/estreias-akira-kurosawa-ou-dodeskaden-e-a-fortaleza-escondida).


Teorizou-se, à época, sobre o desencanto de Kurosawa sobre a humanidade e os seus desígnios. Na realidade, ele mostra neste filme, um conjunto de personagens que aparecem conformados com a sua posição social, muito embora os sonhos os possam levar até uma outra realidade, com aspirações e sentimentos desencontrados. 

Sem dúvida, uma obra-prima, uma denúncia e um alerta, sobre a exclusão sial e as injustiças.


05 outubro 2020

A REPÚBLICA (DES)CONFINADA 


 

Hoje, muito pouca coisa. Confinados a torto e a direto, como as notícias que seguem dentro de momentos. Alguém infectado no conselho de estado, as melhoras sim, senhor conselheiro. As manifestações pela República são, em dia de chuva, muito pouco efusivas. O alastramento da coisa vírica afoga as consciências, obrigadas a manterem-se calmas e quietas. Eu queria inquietas, mas se calhar é pedir demais. Haja alguma contenção, o seu vizinho pode estar com a coisa, melhor seria não falar, não comunicar, não afectar. Não infectar. Lá fora a chuva cai, um lugar comum, comum a estes tempos de outono infeliz. O melhor é mesmo cá dentro, ninguém me incomoda, vou ler e escrever, que isto de consciência também se treina, com treino. Então eu treino. Sei que não vou escrever sobre o mesmo, já alguém faz isso por mim, por nós, todos os dias, nos jornais e nas publicações disponíveis, para alimentar a propaganda. Eu disse propaganda? Talvez a força de tanta coisa inútil, sem sentido, sem tino, mesmo sem ser de rans. No dia da República, devia falar, se calhar,  do busto nu da mesma, só para acicatar os falsos púdicos, ou mesmo os dignatários do regime, que, de tão cinzentos, não sabem e não querem apreciar o que é belo. Belas são as crianças, sei lá, entre outras coisas que não sei citar. Apenas cito o que vejo, da minha janela, do meu canto, no café, onde a bica se consome depressa, mas sabe sempre bem. Se a República é Liberdade e Direitos então proclamemos bem alto o direito de dar aquele grito, que a Liza Minnelli dá, no filme, debaixo da ponte. Coragem, gritem bem alto, nem que seja apenas pelo (falso) prazer de ser LIVRE!


04 outubro 2020

 A COLÓNIA

 

Quando a Esquerda se revela incapaz de organizar-se, enquanto espaço e crisol em que se formam os questionamentos 

e também em que se investem os desejos e as energias, são a direita e a extrema-direita que conseguem acolhê-los e atraí-los

Didier Eribom, “Regresso A Reims”, pág. 146  

 

Aqui há dias, em conversa franca com uma Amiga, de coisas da política geral, dizia-lhe que não me conformo, nem nunca me conformarei, que transformem o meu País, numa colónia de Bruxelas. Expressão que, longe de ser premonitória, é bem real e bem capaz de ser já uma realidade, tal é a fúria devastadora da dita “união europeia”, sobre os putativos “membros”. Na sua boa fé, a minha Amiga perguntava se eu preferia ser uma “colónia da China”.

É uma resposta que goza até de uma certa popularidade, muito particularmente porque a propaganda ocidental se dedica à nobre tarefa de demonizar o “perigo amarelo”.  E não por supostas boas razões, que poderiam ser, por exemplo, de afirmar o definhar permanente da pequenez das liberdades individuais, naquele que é o maior país do mundo. Não, seguramente que o capitalismo não está nada (mesmo nada) preocupado com isso, mas sim, com a concorrência comercial, contra uma globalização infame, imposta sobretudo às economias mais debilitadas, para assim as tornar ainda mais e mais dependentes da “ajuda” providencial das grandes potências e dos grandes senhores do dinheiro.

 

A INEVITABILIDADE 

Sempre o mesmo raciocínio, que, de tão batido e proclamado, acaba por se infiltrar de tal forma, que até os subordinados, os explorados e espoliados, o afirmem e reafirmem, como verdade suprema. Não há alternativa. Porque somos, no caso de Portugal, muito pequenos e nada, ou muito pouco representamos, na economia europeia. E portanto, nunca poderíamos sobreviver, nem prosperar, sozinhos. 

A ideia não é apenas eivada de perfídia. É mesmo “aplicável”, na fraseologia oficial e devidamente sustentada, ainda que de forma muito pouco científica, ou mesmo nada. Contudo é real, fazendo parte do discurso oficial, de governos e de patrões, de agências governamentais e não-governamentais, da comunicação social das grandes empresas de comunicação e dos comentadores encartados e comprometidos, na sua imensa maioria, em difundir uma “verdade” e um pensamento único, que casa perfeitamente com a manutenção dos seus privilégios profissionais.

É no fundo um imenso circo que, à nossa volta, monta um espectáculo de mau gosto, todavia parecendo apetecível, pelo menos em termos de consumo e de obediência generalizada.

 

A RESPOSTA

A minha resposta à pequena “provocação” da minha Amiga, por quem tenho aliás imenso respeito e consideração, foi muito simples. Defendo que o meu País deve cumprir e respeitar a Constituição da República. Particularmente, o seu Artigo 1.º, “Portugal é uma República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária.”.

É tudo muito simples, mais do que isso, é difícil. Ou o País cumpre a sua Constituição, ou perder-se-á rapidamente a identidade, com grave prejuízo, particularmente para aquela camada da população que trabalha e paga os seus impostos.

É pois a primeira das obrigações do Governo da República, cumprir e fazer respeitar a Constituição, acima de qualquer tratado internacional, que deve ser sempre entendido como cumprível, caso não fira o que está escrito na nossa Constituição.

 

O QUE É E O QUE DEVE SER

A tese da “integração europeia” é hoje, mais do que nunca, uma causa perdidaTudo ficará na mesma, enquanto prosseguirem as políticas de desagregação social, determinadas pelo seguidismo a uma causa, como é a "integração europeia". O facto de o nosso País ter abdicado da soberania monetária e adoptado uma moeda estrangeira, tem proporcionado, ao longo das últimas décadas, um efeito verdadeiramente catastrófico, que se pode caracterizar sobretudo pela estagnação, provocando um autêntico choque social, pago, como acontece em todas as crises, por quem trabalha e, ainda por cima vê reduzidos os seus direitos como cidadão. 

Aqueles que agora, tal como outros fizeram antes, contribuem para transformar o nosso País numa colónia de Bruxelas, pagarão o preço da mistificação em que estão envolvidos e em que querem envolver todo um Povo.

Continuará o estado de degradação do País, enquanto distribuem umas migalhas, para mascarar a realidade gritante do desemprego e da miséria social.

Parece na verdade ridículo ver os actuais governantes preocupados com as metas do défice e da dívida. Tudo parece girar em torno daquele conceito, que os transforma em objectivos últimos da política económica. O real desenvolvimento do País é preterido, as necessidades de serviços públicos essenciais para as populações, são sistematicamente colocadas em segundo plano e tudo parece gravitar em tornos de promessas de dinheiro fácil e de miragens fictícias. 

 

O FALHANÇO E A INCAPACIDADE DE O ENTENDER

A imposição do euro, como moeda única, falhou redondamente, como factor de convergência entre os Estados, como facilmente se demonstra e se vê, na prática dos últimos 30 anos. Mas falha também ao absorver institucionalmente as flutuações do mercado cambial. O resultado trágico é impor aos Estados Membros o designado rigor orçamental, que mais não é que uma autêntica camisa de forças na gestão orçamental, o principal agente responsável pelo aumento das desigualdades. Como não existe, ao contrário por exemplo dos EUA, qualquer relação entre o Tesouro e o Banco Central, não é possível aplicar instrumentos que assegurem a estabilidade. Por isso mesmo, a frequência dos choques externos da crise financeira é superior ao normal.

A incapacidade de entender o falhanço é apenas aparente. Enquanto a Alemanha e os países do norte da Europa, economias que pouco têm a ver com a nossa, proliferam e aumentam excedentes, os países do sul continuam a viver sufocados e reféns de um modelo errado de desenvolvimento. Não interessa pois aprofundar o tema, nem questionar o modelo, uma vez que a situação de dependência e de subordinação, são aceites por quem governa. Nunca, em nenhumas eleições, por exemplo, é “permitido” discutir a Europa e a sua mentira. Quem o tenta fazer, é diminuído e mal-entendido. E pior, é acantonado num nicho dito antieuropeu, com conotação negativa.

 

E AS PESSOAS, SENHOR?

Meros joguetes eleitorais, apenas citados para emoldurar pretensos programas sociais, sempre deficitários e muitas vezes entendidos como “grande esfoço nacional”, direitos e salários sempre acima do que é possível, as pessoas que trabalham estão “proibidas” de questionarem o modelo, porque sim e está tudo dito. Pior era como antes, já tudo interessa, menos discutir. Importa garantir votos, seja lá para o que for, em nome de uma pretensa “estabilidade”, que está sempre acima de qualquer debate sério. São porventura os tais “superiores interesses nacionais” que a Direita se arroga em detentora de definir a seu belo prazer. O pior é que certa Esquerda embarca perigosamente neste barco à deriva.

E as pessoas que trabalham e sentem que algo não está bem, viram-se fácil e assustadoramente para aqueles que, de uma forma demagógica e populista, os dizem defender. É o perigo fascista, que espreita a cada esquina e vai ganhando terreno, como se tem visto, particularmente no decurso da situação de pandemia.

 

A DEVOÇÃO E O PERIGO

Citemos aquilo que o economista Jorge Bateira nos transmite, num pequeno artigo, publicado a 2 de Outubro. “Enquanto a devoção ao euro, a moeda única que era suposta proteger-nos de crises financeiras, e a esperança patética numa Europa cada vez mais integrada – quer dizer, germanizada –, a grande potência moderadora na cena internacional, prevalecerem na classe média e nas elites do conhecimento, incluindo na maioria dos que se dizem de esquerda, não haverá dinheiro a fundo perdido que trave a desagregação social, a raiva recalcada, e o crescimento da extrema-direita. Negociar orçamentos sem, no mínimo, explicar ao povo que não há um único país que se tenha desenvolvido sem poder aplicar as políticas económicas e sociais que a UE não permite, é cavar o túmulo da democracia. Dado que o euro é o equivalente do padrão-ouro nos nossos dias, os anos 30 do século passado não me saem da memória.” 

O Autor pede aliás desculpa pela associação de ideias.

Mas é assim mesmo. 

Para a minha Amiga e não só, apenas digo, que o perigo é negro e não amarelo...

 

 


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